sábado, 6 de novembro de 2010

Guerra fria com o Irã pode durar anos', diz especialista

06/11/2010 - 20h25' Folha online

CLAUDIA ANTUNES
DO RIO
Um acordo sobre o programa nuclear do Irã é pouco provável, e o Ocidente deve manter uma política de "contenção", incluindo sanções comerciais e sabotagem industrial, destinada a impedir que o país obtenha material e capacidade técnica necessários para produzir a bomba.


"Vamos ter uma guerra fria com o Irã que pode durar anos, até que, como a União Soviética, o sistema iraniano vai desabar", disse Mark Fitzpatrick, diretor do programa de não proliferação do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos, de Londres.
Segundo o americano, que trabalhou por 26 anos no Departamento de Estado dos EUA, é preciso convencer Israel, única potência nuclear do Oriente Médio, de que a contenção funciona.
Caso contrário, pode haver guerra em um ano e meio, no máximo. "Se o Irã se mantiver no rumo atual, vai cruzar a 'linha vermelha' de Israel."
Ele esteve na última semana no Rio, para a conferência de defesa da Fundação Konrad Adenauer, ligada à Democracia Cristã alemã.
O americano afirmou estar convencido de que o Irã pretende ir ao limiar da bomba, adquirindo a capacidade de fabricá-la em pouco tempo --o que legalmente pode fazer sob o TNP (Tratado de Não Proliferação Nuclear).
Mas ele crê que o país persa ainda não decidiu se fará como a Coreia do Norte, que saiu do tratado para testar seu artefato. Essa seria uma "linha vermelha" óbvia, disse. Mas um passo menor já pode levar à guerra.
"Hoje os iranianos têm o equivalente [em urânio pouco enriquecido] a duas bombas, caso aumentem o enriquecimento. Se em um ano tiverem o equivalente a quatro, pode ser que Israel já considere demais."
A previsão é que após o dia 10 deste mês recomecem as negociações entre Teerã e o P5+1 (potências do Conselho de Segurança da ONU mais a Alemanha), mas não há data.
A base do diálogo seria a troca de urânio enriquecido iraniano por combustível para reatores --a mesma do acordo mediado em maio por Brasil e Turquia, quando a quantidade envolvida não satisfez o P5+1.
Para Fitzpatrick, um acordo possível implicaria no reconhecimento do direito do Irã de manter "algum" enriquecimento --a suspensão é exigida por resoluções do Conselho de Segurança.
Em troca, Teerã não faria estoques --trocaria o material por combustível de fora-- e implementaria o Protocolo Adicional do TNP, autorizando inspeções mais intrusivas em seu projeto atômico.
O problema, diz, é que de um lado os EUA estão "divididos" sobre reconhecer o direito iraniano, o que implicaria na revogação de parte das sanções unilaterais aprovadas pelo Congresso. Do outro, o Irã não parece disposto a desistir da opção nuclear.
"O Irã já disse que não concordará em enviar mais do que está no acordo de maio [1,2 tonelada, contra estimadas 2,5 do estoque atuais]."
BRASIL E TURQUIA
No Rio, Fitzpatrick informou-se sobre o programa nuclear brasileiro. Reuniu-se com o presidente da Abacc (Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares), Odilon do Canto, e disse ter entendido a "relevância" da agência para dar segurança sobre o caráter pacífico das instalações atômicas.
"Dito isso, há um sentimento de que o Brasil possa querer manter suas opções em aberto para o futuro, e não posso deixar de pensar que uma das razões para não assinar o Protocolo Adicional [do TNP] é essa."
Para o americano, a perspectiva de que mais países construam usinas de energia atômica "em si não aumenta o risco de proliferação". Mas ele defende ser preciso evitar novos programas de enriquecimento de urânio e reprocessamento de plutônio.

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