sábado, 16 de abril de 2011

Churchill, de Paul Johnson


Guilherme Montana Se até hoje você não leu a vida de Winston Churchill, narrada em várias biografias; nem leu suas memórias sobre as duas guerras mundiais do século XX, testemunhos de um dos seus principais personagens; nem leu ou ouviu seus discursos, muitos deles proferidos em momentos históricos e escritos numa prosa sublime, aconselharia que você se familiarizasse com este homem lendo Churchill, de Paul Johnson (Nova Fronteira, 2010, 160 págs., tradução de Gleuber Vieira).

Paul Johnson, um conservador jornalista e historiador inglês, escreveu uma biografia concisa e, principalmente, amigável de Churchill. Uma "pocket biography", escrita de forma charmosa, cuja leitura leva apenas um par de horas. Talvez menos, pela maneira elegante como o "perfil" foi escrito.

Paul Jonhson não conviveu com Churchill, há 54 anos de diferença entre eles, mas a virtude do seu livrinho é criar familiaridade entre o leitor e Winston. Uma familiaridade que mesmo o autor, de forma discreta, tenta mostrar com o próprio Churchill. Ele cita alguns encontros breves que teve com o lendário estadista. Uma vez, tinha Johnson dezessete anos, ele perguntou ao primeiro-ministro a que ele atribuía seu sucesso na vida. "Preservação de energia. Nunca ficar em pé quando pode sentar e nunca sentar quando pode deitar." Curioso é que, de acordo com esta e outras leituras de caráter biográfico, tudo leva a crer que Churchill, embora o tenha expressado em tom de anedota, parecia seguir seu princípio de preservação de energia.

Esta "prosa da familiaridade" é uma das características desta tradição britânica, a de escrever biografias. Dr. Samuel Johnson foi um mestre nesta arte, superado pelo seu próprio biógrafo, James Boswell, que escreveu uma biografia inovadora e, hoje, canônica. Ambos estabeleceram o que é biografar, e, no caso do Dr. Johnson, ser biografado ― embora só ele pareça dominado esta outra "arte". Conviveram anos, e Boswell, desde o primeiro encontro, foi o mais ouvinte dos acompanhantes, o mais presente dos convivas, o mais observador dos amigos. "Boswelliano" é o adjetivo para companhia permanente e observadora, a cargo de registrar tudo o que presencia.

A força desta tradição entre os britânicos é tanta que mesmo a biografia de bolso de Churchill por Paul Johnson é mais cuidadosa e confiável que muitas biografias que vemos por aí, autorizadas ou não, de figuras ilustres ou infames. Uma tradição que tanto produziu a Life of Johnson, de Boswell, impecável e prolixa, legível a partir de qualquer página (como disse Borges), quanto The Quest for Corvo, de A.J.A. Symons, um "experimento biográfico" que se assemelha a um romance policial: o biógrafo, Symons, escreve a própria pesquisa, tortuosa e instigante, e os motivos que o levaram a escrever sobre seu excêntrico biografado, Frederick Rolfe, romancista sagaz, pintor talentoso, efebófilo cristão. Mas estes dois exemplos são de outra categoria literária. O que Paul Johnson fez é mais rasteiro e digestivo, sem, no entanto, trivializar seu protagonista ― cuja história já foi tantas vezes escrita.

Escrever a vida de um herói sobre quem já se escreveu tanto é um complicador, mesmo que num breve texto jornalístico. A biografia de Churchill considerada oficial, cujos dois primeiros volumes foram escritos por seu filho Randolph Churchill e os demais por Martin Gilbert, que também os editou, é um monumento que serve menos para o leitor dito comum que para historiadores. Oito volumes abundantes em documentos e cartas, além da consagrada narrativa epopéica de Churchill.

Outro complicador é que este personagem deixou muita coisa escrita sobre si mesmo, e ele era muito bom escritor. As memórias dele, publicadas no Brasil sob os títulos Memórias da Primeira Guerra Mundial e Memórias da Segunda Guerra Mundial, são eloquentes volumes sobre as guerras que ajudaram a definir o século XX, escritos tanto com objetividade histórica quanto com sinceridade subjetiva. Estas duas dimensões pareciam muito bem equilibradas no universo de Winston Churchill, um homem que desde criança pensava grande ― ou imperialmente, como preferir. Essa maneira churchilliana de ver a história, no entanto, rendia comentários, de certa forma pertinentes, como o de Arthur James Balfour: "Winston escreveu um livro enorme sobre si mesmo e o denominou The World Crisis" (as Memórias da Primeira Guerra Mundial...).

Paul Johnson pintou um retrato pequeno mas fiel de Churchill. De forma breve mas não apressada, o leitor passa a conhecer Sir Winston Leonard Spencer-Churchill, um dos grandes do século passado. Está tudo lá no texto. O nascimento complicado, a infância problemática, a inaptidão acadêmica, a carreira como jornalista e escritor, a sagacidade política, o humor arguto, a energia inesgotável, os episódios de Tonypandy, Dardanelos e Dresden, a precoce desconfiança que Adolf Hitler lhe suscitava e a inigualável oratória. Ninguém depois dele teve uma relação tão poderosa com a palavra.

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