terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Influência de extremistas ameaça cristianismo no Oriente Médio


11.01.2007 - A violência, o terrorismo e a influência crescente de extremistas muçulmanos representam uma ameaça para o cristianismo no Oriente Médio. Em alguns países, os integrantes da impopular minoria cristã já estão lutando pela sobrevivência ou fugindo para salvarem as suas vidas.

Na Nova Bagdá, o motorista de um microônibus, um xiita chamado Ali, começou a trabalhar às 7h no último domingo antes do Natal. Poucas horas antes, ele recebeu uma ligação de um telefone celular com instruções para pegar cinco passageiros para uma longa jornada para fora da cidade. A voz ao telefone lhe disse que o primeiro passageiro informaria onde estariam os outros e qual seria o destino do grupo. A pessoa também disse a Ali que não falasse nada a ninguém sobre a viagem.

O primeiro passageiro foi um rapaz de 24 anos, chamado Raymon, que estava sentado sobre a sua mala alguns quarteirões adiante. Ele guiou Ali através da sombria zona leste da cidade, onde ter um xiita como motorista é uma tática inteligente. Eles seguiram primeiro para o distrito de Karrada, onde Amir e Fariz embarcaram, e depois para Selakh, onde Wassim e Qarram aguardavam. Às 9h, Ali havia recolhido todos os passageiros e o microônibus deixou Bagdá e deu início à viagem para o nordeste, uma jornada de 350 quilômetros até o Curdistão, a parte do Iraque na qual insegurança é menor.

Os cinco jovens que viajaram no Kia verde de Ali foram os últimos estudantes seminaristas da Faculdade Católica Caldéia Babel a deixar Bagdá. Quatro padres foram seqüestrados desde meados de agosto do ano passado, e dois outros foram assassinados. O padre Sami, diretor do seminário, foi seqüestrado no início de dezembro. A comunidade conseguiu arrecadar US$ 75 mil para comprar a sua libertação, mas após ter hesitado durante semanas, Emmanuel 3º, o patriarca da Igreja Católica Caldéia, decidiu retirar de Bagdá as instituições de ensino da sua comunidade. Ele ordenou a evacuação das quatro igrejas católicas da cidade, do monastério hurmis e da faculdade na cidade vizinha de Dura, mas decidiu ficar em Bagdá como o pastor solitário de uma congregação que diminui rapidamente.

Uma história que remonta ao Império OtomanoO Iraque de hoje ainda fazia parte do Império Otomano quando os católicos do Iraque abriram o seu primeiro seminário. Eles transferiram a instituição de Mosul para Bagdá 45 anos atrás e, em 1991, sem serem incomodados pelo regime de Saddam Hussein, fundaram a Faculdade Babel de Filosofia e Teologia em Dora. A faculdade só existiria por 15 anos, um período diminuto na história da Igreja Católica Caldéia. "Não sei quando ou se nós algum dia retornaremos", diz Bashar Varda, o homem que o padre Sami escolheu para administrar o seminário.

Os cristão vivem no mundo árabe há 2.000 anos. Eles estavam na região antes dos muçulmanos. O problema atual não é a primeira crise que enfrentam e, comparado aos massacres ocorridos no passado, ele certamente não é o mais grave pelo qual passou o cristianismo no Oriente Médio. Mas em alguns países, esta crise poderá ser a última. Até mesmo o papa, na sua mensagem de Ano Novo, mencionou o "pequeno rebanho" de fiéis no Oriente Médio, que segundo ele são obrigados a viver com "pouca luz e com muita sombra", e exigiu que eles recebessem mais direitos.

Não existem números confiáveis referentes às minorias cristãs no Oriente Médio. Isso pode ser atribuído em parte à escassez de estatísticas, e também ao clima politicamente carregado em torno da produção de tais estatísticas. O último censo do Líbano foi realizado 74 anos atrás. Saddam Hussein, um sunita que era ele próprio parte de uma minoria, se opunha fundamentalmente à compilação de estatísticas referentes aos grupos étnicos. No Egito o número estimado de cristãos oscila entre cinco e 12 milhões, dependendo de quem faça a contagem.

Devido à ausência de números precisos, os demógrafos têm que se basear em estimativas, segundo as quais os cristãos são 40% da população libanesa, menos de 10% da do Egito e da Síria, entre 2% e 4% da jordaniana e iraquiana e menos de 1% daquela do norte da África. Mas as grandes alterações políticas que atualmente afetam o Oriente Médio provocaram à redução das minorias cristãs. Em Jerusalém Oriental, onde a metade da população era cristã até 1948, o ano da primeira guerra árabe-israelense, atualmente menos de 5% professam o cristianismo. Na vizinha Jordânia, o número de cristãos foi reduzido pela metade entre a Guerra dos Seis Dias de 1967 e a década de 1990. Até recentemente havia apenas 500 mil cristãos ainda vivendo no Iraque, comparados aos 750 mil que moravam naquele país após a Guerra do Golfo de 1991. Wassim, um dos seminaristas que acaba de fugir para o Curdistão, calcula que a metade dos cristãos remanescentes emigrou desde que o Iraque foi invadido pelos Estados Unidos em 2003, sendo que a maioria deixou o país nos últimos seis meses.

Fatores demográficos aceleraram essa tendência. Os cristãos, geralmente com maior nível educacional e mais afluentes que os seus vizinhos muçulmanos, têm menos filhos. Como a onda de imigração ocorre há décadas, vários cristãos do Oriente Médio atualmente têm parentes na Europa, na América do Norte e na Austrália. Esses parentes os ajudam a emigrar. O nível educacional elevado aumenta as suas chances de obtenção de um visto. Os que deixam o país são em sua maioria membros da elite: médicos, advogados e engenheiros.

Mas existem razões mais profundas por trás do mais recente êxodo: o fim dos movimentos seculares e a influência crescente do islamismo político no Oriente Médio.

Foi Michel Aflaq, um cristão sírio, que fundou o movimento nacionalista baath em 1940, um fator que se constituiu em uma rota de ascensão de carreira para os cristãos até 2003, e que ainda representa uma salvaguarda política para muitos cristãos sírios de hoje. O ex-presidente egípcio Gamal Abd al-Nasser não via problemas em homenagear a Virgem Maria, que teria aparecido no telhado de uma igreja de um subúrbio do Cairo após a derrota do Egito para Israel na guerra de 1967. E o ex-presidente palestino Iasser Arafat, que morreu em 2004, insistia em sentar-se na primeira fileira da Igreja da Natividade, em Belém, durante a missa anual de Natal.

Mas tudo isso é coisa do passado. Os últimos cristãos proeminentes - o membro da Igreja Católica Caldéia, Tariq Aziz, que foi durante vários anos ministro das Relações Exteriores de Saddam Hussein, e Hanan Shrawi, ministro da Educação de Iasser Arafat - desapareceram do cenário político do Oriente Médio. E desde as vitórias eleitorais da Irmandade Muçulmana no Egito, do Hamas na Palestina, da ascensão do Hezbollah no Líbano e das sangrentas lutas pelo poder entre milícias sunitas e xiitas no Iraque, a ilusão de que os políticos cristãos ainda seriam capazes de desempenhar um papel importante no mundo árabe se desvaneceu completamente.

Os cristãos coptas do Egito, cujo número é de no mínimo cinco milhões, são de longe a maior minoria cristã no Oriente Médio. O calendário da Igreja Cristã Copta, que remonta à época de São Marcos, o Evangelista, tem início em 284 DC, ano do ápice da perseguição movida pelos romanos contra os cristãos. O líder espiritual dos coptas é o papa Shenouda 3º, de 83 anos.

Os ativistas coptas reclamam há vários anos da discriminação que sofrem nas mãos do Estado egípcio. Yussuf Sidham, editor-chefe do jornal semanal copta "Watani", diz que, ao contrário do que ocorreu na década de 1970, atualmente existe pouca violência ostensiva entre muçulmanos e cristãos. "Em vez disso, hoje em dia estamos lutando contra as idéias malucas dos fundamentalistas islâmicos. Existe um fosso cada vez mais amplo separando as forças liberais e as fundamentalistas.

Quando os egípcios elegeram um novo parlamento em 2005, o governista Partido Democrático Nacional incluiu apenas dois coptas na sua lista de 444 candidatos - e atualmente apenas um membro do gabinete, o ministro das Finanças, é um cristão copta. Sidham critica o partido por promover esse tipo de coisa. "O partido diz que os candidatos foram eleitos devido às suas filiações religiosas. Os coptas têm menos chances. Então por que eles foram lançados como candidatos?".

Esse tipo de perseguição não se constitui em uma novidade no Egito. Quando as tropas de Napoleão avançaram pelo delta do Nilo em 1789 e ocuparam o Egito, elas notaram costumes estranhos. Exigia-se que as mulheres coptas usassem um sapato azul e o outro vermelho. Os homens coptas tinham permissão para andar a cavalo, mas somente com as costas voltadas para a cabeça do animal. Os franceses perceberam rapidamente que os coptas se constituíam na "troisième classe" - os cidadãos de terceira classe. Alguns continuam ainda hoje a se sentir membros deste grupo discriminado.

Quando os cristãos se inscrevem para receber a carteira de identidade no Egito, de vez em quando são registrados como muçulmanos - sem que saibam disso. E depois que o registro se torna o oficial, podem ser necessárias dezenas de visitas às agências governamentais para corrigir o erro.

Durante décadas, conseguir uma permissão para erguer uma nova igreja no Egito se constituiu em um autêntico teste de paciência para os cristãos coptas. Segundo uma arcaica lei egípcia do tempo do Império Otomano, era necessária a aprovação do presidente para um projeto tão insignificante quanto a reforma do telhado da igreja. Hosni Mubarak, o atual presidente egípcio, só aboliu essa lei no ano passado.

As mulheres coptas que trabalham para o governo e se recusam a usar um véu muçulmano são constantemente assediadas, assim como os homens que trabalham na companhia errada. Um funcionário de 31 anos de uma companhia norte-americana de software conta que o seu patrão sofre assédios diários. Segundo o funcionário, o problema do patrão não é ser um mau supervisor, mas simplesmente o fato de ser copta.

E a vida é ainda mais difícil para os cerca de cem muçulmanos egípcios que se convertem a cada ano ao cristianismo. A violência irrompeu em Alexandria em outubro de 2005 após a exibição de uma peça teatral sobre um copta que se arrepende de ter se convertido ao islamismo. Vários manifestantes muçulmanos foram mortos e uma igreja ficou semi-destruída. Para a maioria dos muçulmanos a mudança de religião é um crime grave. Mas para os cristãos que desejam se converter ao islamismo, o governo chegou a criar um canal facilitador. Cerca de mil coptas se convertem ao islamismo anualmente.

Fonte: UOL notícias

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