Tyler Cowen
Auschwitz foi o assassinato de seis milhões de judeus e o despejo de seus corpos nas lixeiras pela Europa, em razão da forma pela qual eles eram vistos, como judeus endinheirados. O capital financeiro e os bancos, o coração do sistema imperialista e capitalista, apontaram o ódio do homem contra o dinheiro e a exploração, e também contra os judeus… O anti-semitismo é, na realidade, o ódio ao capitalismo.
Ulrike Meinhof, terrorista alemão de esquerda da década de 1970.
O capitalismo e a economia de mercado encorajam a tolerância racial, étnica e religiosa ao tolerar costumes e estilos de vida diversos. Economias fortemente reguladas ou socialistas, por outro lado, tendem a alimentar a intolerância e a perseguição étnica. O socialismo leva a baixas taxas de crescimento da economia, à disputas sobre a utilização de recursos e à concentração do poder político – condições que encorajam o conflito ao invés da cooperação. Minorias étnicas e religiosas geralmente passam por dificuldades quando prevalece a coerção política. Colapsos econômicos – frequentemente associados ao intervencionismo – agravam o problema, desencadeando forças psicológicas destrutivas como a inveja e o ressentimento, que alimentam o preconceito e a perseguição.
Enquanto a discriminação está presente em todos os tipos de sociedade, no ambiente de mercado os discriminadores sofrem prejuízos financeiros por causa de seus preconceitos. Mesmo aqueles com atitudes preconceituosas, em geral, fazem comércio com as minorias. As pessoas intolerantes tentam oprimir as minorias socializando seus custos por meio da ação governamental. Dificilmente elas estariam dispostos a dar continuidade à discriminação se tivessem que arcar sozinhas com os custos. Interações comerciais continuadas também aumentam a familiaridade com costumes e estilos de vida que de outra forma poderiam ser vistos como incomuns ou estranhos. O crescimento econômico continuado alivia tensões políticas e sociais, gerando mais recursos para todos.
A história do povo judeu ilustra a posição relativamente favorável para as minorias em uma economia de mercado. A hostilidade contra a troca e o comércio quase sempre alimentou a hostilidade contra os judeus e vice-versa. As sociedades mais amistosas à vida comercial, em seus tempos – a Itália renascentista, as economias capitalistas emergentes da Inglaterra e da Holanda no século XVII e os Estados Unidos – se mostraram as mais tolerantes em relação aos judeus. Ellis Rivkin, em sua obra prima subestimada, The Shaping of Jewish History: A radical new interpretation, escreveu:
Desde a Segunda Guerra Mundial, os judeus e o judaísmo têm sido libertos em todos os países e territórios onde o capitalismo foi reconduzido a um crescimento vigoroso– e isso inclui a Alemanha. Em contraste, em todos os lugares onde o anticapitalismo e o pré-capitalismo prevaleceram, o status dos judeus e do judaísmo se deteriorou ou é altamente precário. Dessa forma, nesse momento, o país no qual o capitalismo global está mais avançado, os Estados Unidos, concede aos judeus e ao judaísmo uma liberdade jamais vista em qualquer outro lugar do mundo. Uma liberdade que não é conhecida nem mesmo em Israel… Por outro lado, na União Soviética, a fortaleza do anticapitalismo, os judeus são amedrontados pelo anti-semitismo, ameaçados de extinção e impedidos de terem acesso a seu Deus.
As origens socialistas do anti-semitismo moderno mostram a ligação entre o estatismo e a perseguição de minorias. O anti-semitismo como um movimento intelectual formal surgiu no meio do século XIX, quando teorias conspiratórias relacionadas aos judeus ganharam popularidade. Escritores alemães retomaram antigas teorias anti-iluministas, sobre uma conspiração maçônico-judia para a dominação do mundo. Durante a revolução francesa, os judeus, junto com os maçons, eram identificados como forças de apoio ao liberalismo, ao secularismo e ao capitalismo. Escritores alemães rapidamente descobriram que os judeus eram um alvo mais popular que os maçons, talvez por serem mais visíveis e diferentes. As teorias maçônico-judias originais acabaram por relegar ao segundo plano outros conspiradores, como os Templários e os Illuminati, e se focaram nos judeus.
O Anti-semitismo na Alemanha e na Áustria no século XIX
A crença anti-semita foi formalizada por Wilhelm Marr, um escritor alemão que cunhou o termo “anti-semitismo”. Em 1879, Marr publicou seu livro Der Sieg der lidenthums über der Germanenthum (A Vitória do Judaísmo sobre o Germanismo) que atingiu doze edições em seis anos. Ele também fundou o Jornal Anti-semita e inaugurou a Liga Anti-semita. Marr idolatrava a Rússia czarista e, mais cedo em sua carreira, tinha sido um socialista radical. Os novos anti-semitas que seguiram Marr expandiram os ataques medievais a negociantes e banqueiros judeus e os desenvolveram em uma critica econômica de grande escala. Os judeus que provocavam mais ira eram aqueles que aderiam aos valores cosmopolitas, iluministas e que atingiam o sucesso econômico.
Na segunda metade do século XIX, a Alemanha se tornou o primeiro país a desenvolver sistematicamente movimentos políticos e intelectuais anti-semitas. Na Alemanha, o Partido Social-Cristão, de Adolf Stocker, combinou o anti-semitismo com uma legislação reformista, de viés esquerdista. O Partido atacava a economia do laissez-faire e os judeus, como sendo partes da mesma praga liberal. O movimento de Stocker sintetizava o anti-semitismo medieval, baseado na religião, e o anti-semitismo moderno, baseado no racismo e na economia socialista. Certa ocasião, Stocker escreveu: eu vejo no capitalismo desenfreado o mal de nossa era e, também sou, naturalmente, um oponente do judaísmo moderno por conta de minhas visões sócio-políticas. Stocker reverenciava a aristocracia prussiana desde sua juventude.
Georg Ritter Von Schonerer liderou o movimento esquerdista e anti-semita na Áustria. O Partido Liberal Alemão, de Schonerer, desenvolveu uma plataforma anti-semita e anticapitalista, direcionada à classe-média/baixa, nos anos 1880. Schonerer direcionou seu anti-semitismo às atividades econômicas dos Rothschilds; ele pregava a nacionalização de suas propriedades no ramo ferroviário. Mais tarde, ele expandiu seus argumentos para atacar comerciantes judeus em geral. Hitler foi um grande admirador de Schonerer e, quando jovem, chegou a pendurar alguns dos slogans de Schonerer sobre sua cama.
Os crescentes movimentos socialistas do século XIX pouco fizeram na contenção da onda anti-semita e quase sempre promoveram explicitamente o anti-semitismo. A ligação inicial entre o socialismo e o anti-semitismo surgiu por conta de afinidades intelectuais. Por todo o século XIX, a crítica socialista do capitalismo e a crítica anti-semita usaram os mesmos argumentos. Muitos socialistas viam o anti-semitismo como uma etapa no caminho em direção a uma visão socialista mais consistente. Os primeiros filósofos socialistas sistemáticos, os utopistas franceses do início do século XIX, envolviam os judeus em suas críticas ao capitalismo. Os judeus franceses eram bantante ligados ao comércio, às finanças e ao capitalismo. Proudhon e Fourier, que advogaram pela abolição da usura, deferiram seus ataques mais odiosos contra os agiotas judeus.
Karl Marx continuou a discussão anti-semita entre os socialistas. A associação histórica entre os judeus, a propriedade privada e o comércio o levou a algumas de suas conhecidas críticas anti-semitas. Marx, que pretendia reconstruir a sociedade de acordo com seu plano, detestava a natureza particularística da religião e dos costumes judeus. Alguns seguidores de Marx, como Duhring e Lassalle, utilizaram o anti-semitismo como meio para introduzir a doutrina anticapitalista. Eles acreditavam que se o público pudesse ser convencido a odiar os capitalistas judeus, iriam, a seguir, odiar os capitalistas não judeus também.
Uma piada bastante conhecida no século XIX descrevia o anti-semitismo como o socialismo dos idiotas (der Sozialismus des bloden Mannes). Era evidente que os anti-semitas compartilhavam as mesmas queixas que os socialistas; os anti-semitas apenas refinaram mais seu alvo. Os socialistas aceitaram com felicidade o espírito do anti-semitismo, desde que o alvo fosse expandido a toda classe capitalista. Mais recentemente, o historiador Paul Johnson apontou com ironia que o socialismo tem servido como o anti-semitismo dos intelectuais.
Mesmo quando os socialistas se opuseram ao anti-semitismo, como ocorreu mais tarde por razões táticas, os partidos socialistas europeus não conseguiram desenvolver uma oposição eficiente às tendências anti-semitas. Muitos socialistas, com sua oposição ao capitalismo, se mostravam relutantes em defender as atividades econômicas dos judeus. O socialismo fingia ser um movimento revolucionário, liberal, mas, na verdade, abraçava a doutrina conservadora do poder estatal concentrado. A maioria dos socialistas apoiou a Primeira Guerra Mundial, que deu um grande impulso ao anti-semitismo, sem hesitação. O partido nazista, o mais ferrenho inimigo dos judeus, foi, desde o início, um partido nacional-socialista.
O Anti-Semitismo Soviético
A prática real do socialismo não tem sido generosa em relação às minorias étnicas e religiosas, inclusive aos judeus. O governo soviético adotou sistematicamente políticas anti-semitas. Lênin se opunha fortemente ao anti-semitismo, porém, a política soviética mudou logo após sua morte. Estados totalitários, com suas inevitáveis falhas econômicas, sempre precisam de um bode expiatório. O desempenho econômico raramente corresponde às promessas oficiais e as privações que surgem a partir daí alimentam um ressentimento social: uma pessoa pode só prosperar às custas de outra. As necessidades de um governo totalitário, com o tempo, suprimem quaisquer sentimentos não-racistas que os líderes políticos possam ter e criam pressões para o apoio político ao racismo. O controle sobre a imprensa e a liberdade de expressão faz da incitação de sentimentos racistas uma tarefa fácil.
O anti-semitismo soviético cresceu após a Segunda Guerra Mundial, quando os líderes comunistas foram incapazes de resistir ao alvo que fora apontado com tanto sucesso por Hitler. Em 1953, Stálin alegou a existência de um complô dos médicos, idealizado por judeus, para envenenar os principais líderes soviéticos. Stálin morreu antes que os julgamentos fossem realizados, mas já estava planejando deportar dois milhões de judeus para a Sibéria. As execuções por crimes econômicos do inicio dos anos 1960 eram, em grande parte, direcionadas aos judeus.
Livros escolares foram reescritos, seja para apagar o papel dos judeus na história ou para fornecer estereótipos negativos deles. Textos fornecidos pelo governo sobre a Alemanha e a Segunda Guerra Mundial não mencionavam nem os judeus nem o holocausto. Os massacres russos foram reinterpretados como uma retribuição justificada pelos excessos capitalistas dos judeus. O governo soviético atacou todas as formas de religião, mas o judaísmo acima de todas as outras.
A Alemanha Oriental continuou as controvérsias nazistas contra os judeus, substituindo as palavras “Sionista” ou “Israel” por “Judeu”, e nas principais propriedades das forças socialistas progressistas havia pouca diferença em relação à terminologia do nacional socialismo. Vários antigos jornalistas nazistas foram empregados para escrever argumentos anti-sionistas. Uma tendência similar ocorreu por toda a Europa Oriental. No início dos anos 1950, treze líderes do Partido Comunista Tcheco (sendo dez judeus) foram acusados de serem Sionistas e enforcados. Em 1968, a mídia polonesa passou meses debatendo o desmascaramento de sionistas na Polônia, embora os judeus correspondessem a bem menos de um por cento da população. A campanha anti-sionista foi acompanhada de manifestações, prisões, inspeções, perseguição policial e outros métodos típicos da opressão totalitária.
O contraste com os Estados Unidos capitalista é impressionante. Os Estados Unidos começaram com alguns judeus, mas atraíram mais imigrantes com sua economia relativamente livre e sua atmosfera de relativa tolerância. Nos anos 1920, três das quatro cidades com mais judeus no mundo estavam localizadas nos Estados Unidos. Nova York tinha o maior número de judeus. Chicago e Filadélfia ocupavam o terceiro e quarto lugares, respectivamente (Budapeste era a segunda). Hoje, os judeus correspondem a dois por cento da população americana, mas à metade dos bilionários. A história dos judeus é um grande exemplo das diferenças entre o capitalismo e o socialismo.
Tradução por Magno Karl
Auschwitz foi o assassinato de seis milhões de judeus e o despejo de seus corpos nas lixeiras pela Europa, em razão da forma pela qual eles eram vistos, como judeus endinheirados. O capital financeiro e os bancos, o coração do sistema imperialista e capitalista, apontaram o ódio do homem contra o dinheiro e a exploração, e também contra os judeus… O anti-semitismo é, na realidade, o ódio ao capitalismo.
Ulrike Meinhof, terrorista alemão de esquerda da década de 1970.
O capitalismo e a economia de mercado encorajam a tolerância racial, étnica e religiosa ao tolerar costumes e estilos de vida diversos. Economias fortemente reguladas ou socialistas, por outro lado, tendem a alimentar a intolerância e a perseguição étnica. O socialismo leva a baixas taxas de crescimento da economia, à disputas sobre a utilização de recursos e à concentração do poder político – condições que encorajam o conflito ao invés da cooperação. Minorias étnicas e religiosas geralmente passam por dificuldades quando prevalece a coerção política. Colapsos econômicos – frequentemente associados ao intervencionismo – agravam o problema, desencadeando forças psicológicas destrutivas como a inveja e o ressentimento, que alimentam o preconceito e a perseguição.
Enquanto a discriminação está presente em todos os tipos de sociedade, no ambiente de mercado os discriminadores sofrem prejuízos financeiros por causa de seus preconceitos. Mesmo aqueles com atitudes preconceituosas, em geral, fazem comércio com as minorias. As pessoas intolerantes tentam oprimir as minorias socializando seus custos por meio da ação governamental. Dificilmente elas estariam dispostos a dar continuidade à discriminação se tivessem que arcar sozinhas com os custos. Interações comerciais continuadas também aumentam a familiaridade com costumes e estilos de vida que de outra forma poderiam ser vistos como incomuns ou estranhos. O crescimento econômico continuado alivia tensões políticas e sociais, gerando mais recursos para todos.
A história do povo judeu ilustra a posição relativamente favorável para as minorias em uma economia de mercado. A hostilidade contra a troca e o comércio quase sempre alimentou a hostilidade contra os judeus e vice-versa. As sociedades mais amistosas à vida comercial, em seus tempos – a Itália renascentista, as economias capitalistas emergentes da Inglaterra e da Holanda no século XVII e os Estados Unidos – se mostraram as mais tolerantes em relação aos judeus. Ellis Rivkin, em sua obra prima subestimada, The Shaping of Jewish History: A radical new interpretation, escreveu:
Desde a Segunda Guerra Mundial, os judeus e o judaísmo têm sido libertos em todos os países e territórios onde o capitalismo foi reconduzido a um crescimento vigoroso– e isso inclui a Alemanha. Em contraste, em todos os lugares onde o anticapitalismo e o pré-capitalismo prevaleceram, o status dos judeus e do judaísmo se deteriorou ou é altamente precário. Dessa forma, nesse momento, o país no qual o capitalismo global está mais avançado, os Estados Unidos, concede aos judeus e ao judaísmo uma liberdade jamais vista em qualquer outro lugar do mundo. Uma liberdade que não é conhecida nem mesmo em Israel… Por outro lado, na União Soviética, a fortaleza do anticapitalismo, os judeus são amedrontados pelo anti-semitismo, ameaçados de extinção e impedidos de terem acesso a seu Deus.
As origens socialistas do anti-semitismo moderno mostram a ligação entre o estatismo e a perseguição de minorias. O anti-semitismo como um movimento intelectual formal surgiu no meio do século XIX, quando teorias conspiratórias relacionadas aos judeus ganharam popularidade. Escritores alemães retomaram antigas teorias anti-iluministas, sobre uma conspiração maçônico-judia para a dominação do mundo. Durante a revolução francesa, os judeus, junto com os maçons, eram identificados como forças de apoio ao liberalismo, ao secularismo e ao capitalismo. Escritores alemães rapidamente descobriram que os judeus eram um alvo mais popular que os maçons, talvez por serem mais visíveis e diferentes. As teorias maçônico-judias originais acabaram por relegar ao segundo plano outros conspiradores, como os Templários e os Illuminati, e se focaram nos judeus.
O Anti-semitismo na Alemanha e na Áustria no século XIX
A crença anti-semita foi formalizada por Wilhelm Marr, um escritor alemão que cunhou o termo “anti-semitismo”. Em 1879, Marr publicou seu livro Der Sieg der lidenthums über der Germanenthum (A Vitória do Judaísmo sobre o Germanismo) que atingiu doze edições em seis anos. Ele também fundou o Jornal Anti-semita e inaugurou a Liga Anti-semita. Marr idolatrava a Rússia czarista e, mais cedo em sua carreira, tinha sido um socialista radical. Os novos anti-semitas que seguiram Marr expandiram os ataques medievais a negociantes e banqueiros judeus e os desenvolveram em uma critica econômica de grande escala. Os judeus que provocavam mais ira eram aqueles que aderiam aos valores cosmopolitas, iluministas e que atingiam o sucesso econômico.
Na segunda metade do século XIX, a Alemanha se tornou o primeiro país a desenvolver sistematicamente movimentos políticos e intelectuais anti-semitas. Na Alemanha, o Partido Social-Cristão, de Adolf Stocker, combinou o anti-semitismo com uma legislação reformista, de viés esquerdista. O Partido atacava a economia do laissez-faire e os judeus, como sendo partes da mesma praga liberal. O movimento de Stocker sintetizava o anti-semitismo medieval, baseado na religião, e o anti-semitismo moderno, baseado no racismo e na economia socialista. Certa ocasião, Stocker escreveu: eu vejo no capitalismo desenfreado o mal de nossa era e, também sou, naturalmente, um oponente do judaísmo moderno por conta de minhas visões sócio-políticas. Stocker reverenciava a aristocracia prussiana desde sua juventude.
Georg Ritter Von Schonerer liderou o movimento esquerdista e anti-semita na Áustria. O Partido Liberal Alemão, de Schonerer, desenvolveu uma plataforma anti-semita e anticapitalista, direcionada à classe-média/baixa, nos anos 1880. Schonerer direcionou seu anti-semitismo às atividades econômicas dos Rothschilds; ele pregava a nacionalização de suas propriedades no ramo ferroviário. Mais tarde, ele expandiu seus argumentos para atacar comerciantes judeus em geral. Hitler foi um grande admirador de Schonerer e, quando jovem, chegou a pendurar alguns dos slogans de Schonerer sobre sua cama.
Os crescentes movimentos socialistas do século XIX pouco fizeram na contenção da onda anti-semita e quase sempre promoveram explicitamente o anti-semitismo. A ligação inicial entre o socialismo e o anti-semitismo surgiu por conta de afinidades intelectuais. Por todo o século XIX, a crítica socialista do capitalismo e a crítica anti-semita usaram os mesmos argumentos. Muitos socialistas viam o anti-semitismo como uma etapa no caminho em direção a uma visão socialista mais consistente. Os primeiros filósofos socialistas sistemáticos, os utopistas franceses do início do século XIX, envolviam os judeus em suas críticas ao capitalismo. Os judeus franceses eram bantante ligados ao comércio, às finanças e ao capitalismo. Proudhon e Fourier, que advogaram pela abolição da usura, deferiram seus ataques mais odiosos contra os agiotas judeus.
Karl Marx continuou a discussão anti-semita entre os socialistas. A associação histórica entre os judeus, a propriedade privada e o comércio o levou a algumas de suas conhecidas críticas anti-semitas. Marx, que pretendia reconstruir a sociedade de acordo com seu plano, detestava a natureza particularística da religião e dos costumes judeus. Alguns seguidores de Marx, como Duhring e Lassalle, utilizaram o anti-semitismo como meio para introduzir a doutrina anticapitalista. Eles acreditavam que se o público pudesse ser convencido a odiar os capitalistas judeus, iriam, a seguir, odiar os capitalistas não judeus também.
Uma piada bastante conhecida no século XIX descrevia o anti-semitismo como o socialismo dos idiotas (der Sozialismus des bloden Mannes). Era evidente que os anti-semitas compartilhavam as mesmas queixas que os socialistas; os anti-semitas apenas refinaram mais seu alvo. Os socialistas aceitaram com felicidade o espírito do anti-semitismo, desde que o alvo fosse expandido a toda classe capitalista. Mais recentemente, o historiador Paul Johnson apontou com ironia que o socialismo tem servido como o anti-semitismo dos intelectuais.
Mesmo quando os socialistas se opuseram ao anti-semitismo, como ocorreu mais tarde por razões táticas, os partidos socialistas europeus não conseguiram desenvolver uma oposição eficiente às tendências anti-semitas. Muitos socialistas, com sua oposição ao capitalismo, se mostravam relutantes em defender as atividades econômicas dos judeus. O socialismo fingia ser um movimento revolucionário, liberal, mas, na verdade, abraçava a doutrina conservadora do poder estatal concentrado. A maioria dos socialistas apoiou a Primeira Guerra Mundial, que deu um grande impulso ao anti-semitismo, sem hesitação. O partido nazista, o mais ferrenho inimigo dos judeus, foi, desde o início, um partido nacional-socialista.
O Anti-Semitismo Soviético
A prática real do socialismo não tem sido generosa em relação às minorias étnicas e religiosas, inclusive aos judeus. O governo soviético adotou sistematicamente políticas anti-semitas. Lênin se opunha fortemente ao anti-semitismo, porém, a política soviética mudou logo após sua morte. Estados totalitários, com suas inevitáveis falhas econômicas, sempre precisam de um bode expiatório. O desempenho econômico raramente corresponde às promessas oficiais e as privações que surgem a partir daí alimentam um ressentimento social: uma pessoa pode só prosperar às custas de outra. As necessidades de um governo totalitário, com o tempo, suprimem quaisquer sentimentos não-racistas que os líderes políticos possam ter e criam pressões para o apoio político ao racismo. O controle sobre a imprensa e a liberdade de expressão faz da incitação de sentimentos racistas uma tarefa fácil.
O anti-semitismo soviético cresceu após a Segunda Guerra Mundial, quando os líderes comunistas foram incapazes de resistir ao alvo que fora apontado com tanto sucesso por Hitler. Em 1953, Stálin alegou a existência de um complô dos médicos, idealizado por judeus, para envenenar os principais líderes soviéticos. Stálin morreu antes que os julgamentos fossem realizados, mas já estava planejando deportar dois milhões de judeus para a Sibéria. As execuções por crimes econômicos do inicio dos anos 1960 eram, em grande parte, direcionadas aos judeus.
Livros escolares foram reescritos, seja para apagar o papel dos judeus na história ou para fornecer estereótipos negativos deles. Textos fornecidos pelo governo sobre a Alemanha e a Segunda Guerra Mundial não mencionavam nem os judeus nem o holocausto. Os massacres russos foram reinterpretados como uma retribuição justificada pelos excessos capitalistas dos judeus. O governo soviético atacou todas as formas de religião, mas o judaísmo acima de todas as outras.
A Alemanha Oriental continuou as controvérsias nazistas contra os judeus, substituindo as palavras “Sionista” ou “Israel” por “Judeu”, e nas principais propriedades das forças socialistas progressistas havia pouca diferença em relação à terminologia do nacional socialismo. Vários antigos jornalistas nazistas foram empregados para escrever argumentos anti-sionistas. Uma tendência similar ocorreu por toda a Europa Oriental. No início dos anos 1950, treze líderes do Partido Comunista Tcheco (sendo dez judeus) foram acusados de serem Sionistas e enforcados. Em 1968, a mídia polonesa passou meses debatendo o desmascaramento de sionistas na Polônia, embora os judeus correspondessem a bem menos de um por cento da população. A campanha anti-sionista foi acompanhada de manifestações, prisões, inspeções, perseguição policial e outros métodos típicos da opressão totalitária.
O contraste com os Estados Unidos capitalista é impressionante. Os Estados Unidos começaram com alguns judeus, mas atraíram mais imigrantes com sua economia relativamente livre e sua atmosfera de relativa tolerância. Nos anos 1920, três das quatro cidades com mais judeus no mundo estavam localizadas nos Estados Unidos. Nova York tinha o maior número de judeus. Chicago e Filadélfia ocupavam o terceiro e quarto lugares, respectivamente (Budapeste era a segunda). Hoje, os judeus correspondem a dois por cento da população americana, mas à metade dos bilionários. A história dos judeus é um grande exemplo das diferenças entre o capitalismo e o socialismo.
Tradução por Magno Karl
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