Os limites da Ciência (e ao falar 
Ciência refiro-me à sua forma mais exata, a Física) são fixados pelo seu
 próprio método. O método da Física versa sobre os aspectos 
quantitativos das coisas em movimento. Só podemos aplicar legitimamente o
 método da Física quando captamos aspectos quantitativos das coisas. Mas
 se diante das coisas surgem questões como “Isso é bonito?” ou “Isso 
existe?” ou “Isso é moralmente bom?”, então estamos fazendo perguntas 
que o método da Física não permite responder. Hoje em dia – quando 
muitos desejam respostas científicas para as suas perguntas – é muito 
importante que essa limitação do método científico seja manifestada com 
clareza por físicos de renome.
Os físicos têm uma grande autoridade 
epistemológica. Qualquer coisa dita por um Prêmio Nobel de Física, mesmo
 que não esteja relacionada com o seu campo específico de estudo, logo 
aparece publicada pela imprensa: ele pode falar dos assuntos mais 
variados, e até dizer bobagens. Não importa o que diga, é mais fácil ver
 as pessoas duvidarem de si mesmas antes de duvidarem de um Prêmio Nobel
 de Física. Alguns físicos têm abusado muito da confiança que as pessoas
 depositam neles. De qualquer modo – e tendo em vista que esses abusos 
acabaram tornando-se coisa de rotina –, descobrimos uma pista que nos 
leva a um dos maiores males da cultura Ocidental contemporânea: um 
interesse quase exclusivo por quantidades. Virou moda recorrer às 
estatísticas para analisar questões morais: quantos agem desta maneira e
 quantos agem daquela outra? Depois – nos raros casos em que se chega a 
alguma conclusão –, afirma se que é preferível agir conforme a maioria.
Em outras palavras, o perigo “potencial”
 que existe no método científico é o de que sob a sua influência podemos
 acabar quadriculando a nossa sensibilidade em padrões previamente 
fixados. Já que um padrão pode ser medido, podemos cair na tentação de 
pensar que encontraremos a resposta para uma dada pergunta tão logo 
obtivermos certos resultados quantitativos. Agindo assim, é possível que
 estejamos eliminando justamente os aspectos mais interessantes da 
própria pergunta, especialmente se ela for uma pergunta estética, moral 
ou sobre a existência de algo.
Um cientista observa, por exemplo, uma 
amostra no seu microscópio. Ao fazê-lo, aplica legitimamente o método 
científico. Mas esse método não pode garantir-lhe nem mesmo o simples 
fato de que o microscópio existe e está diante dele. Ponho ênfase nos 
verbos existir, estar e ser, pois são os mais metafísicos de todos os 
verbos: o método da Ciência não sabe lidar com eles.
“NINGUÉM DEVE UNIR O QUE DEUS SEPAROU”
Qual a sua opinião sobre unir os estudos humanísticos e os científicos num currículo universitário único?
Penso que os estudos humanísticos e os científicos devam estar separados. Não se deve tentar uni-los porque partem de diferentes pressupostos e têm métodos também diferentes. Nas Humanidades, quando estudamos Dante, por exemplo, não perguntamos quantas letras tem a Divina Comédia (ou qualquer outra obra sua). Tal pergunta no campo científico seria até cabível. Contudo, ao estudarmos obras literárias, o nosso propósito é bem específico, e para esse estudo o método científico é de escassa utilidade. As obras literárias geralmente trazem lições de moralidade e de Ética; versam sobre os desígnios humanos, sobre o destino, sobre as reações das diferentes pessoas perante dilemas de consciência. Nenhuma dessas questões pode ser resolvida empregando-se o método científico.
Penso que os estudos humanísticos e os científicos devam estar separados. Não se deve tentar uni-los porque partem de diferentes pressupostos e têm métodos também diferentes. Nas Humanidades, quando estudamos Dante, por exemplo, não perguntamos quantas letras tem a Divina Comédia (ou qualquer outra obra sua). Tal pergunta no campo científico seria até cabível. Contudo, ao estudarmos obras literárias, o nosso propósito é bem específico, e para esse estudo o método científico é de escassa utilidade. As obras literárias geralmente trazem lições de moralidade e de Ética; versam sobre os desígnios humanos, sobre o destino, sobre as reações das diferentes pessoas perante dilemas de consciência. Nenhuma dessas questões pode ser resolvida empregando-se o método científico.
Devemos cultivar tanto os aspectos 
quantitativos das coisas quanto aqueles que não são mensuráveis, ou 
seja, os seus aspectos qualitativos. O estudo dos aspectos quantitativos
 pressupõe o método científico, mas as Humanidades partem de um método 
distinto, e por isso devem ser tratadas de um modo diferente. O problema
 da nossa cultura é que estamos condicionados por duzentos ou trezentos 
anos de Ciência: por isso é tão difícil para nós tratar de questões 
unicamente qualitativas. A grande importância que se dá à Ciência nos 
tempos atuais torna ainda mais difícil a questão.
Gostaria de repetir uma coisa que já 
ressaltei muitas vezes: nenhum homem deve unir as coisas que Deus 
separou. E de que modo ou em que sentido Deus separou essas coisas? O 
sentido é que existe uma irredutibilidade conceitual entre os aspectos 
quantitativos e qualitativos das coisas. Como exemplo poderíamos pensar 
na ação de assassinar. Essa ação – pegar uma faca e cravá-la nas costas 
de alguém – pode ser corretamente descrita em termos quantitativos: 
pode-se medir o tamanho da faca, a profundidade da ferida e o momento 
exato em que a vítima expirou. Ainda assim, tais dados não nos 
permitiriam descobrir se a pessoa assassinada era inocente ou não, nem 
se a ação foi moralmente lícita ou ilícita, nem tampouco se a pessoa que
 cometeu o crime sentiu ou não sentiu remorsos.
Os aspectos físicos e morais de uma ação
 não podem ser equiparados conceitualmente. É isso que quero dizer 
quando afirmo que ninguém deve unir o que Deus separou. Não é que esses 
aspectos estejam separados no sentido de que nada têm a ver um com o 
outro: simplesmente trata-se de que, ao tentarmos compreender esses 
aspectos diferentes, devemos ter em conta que estamos manejando
 conceitos totalmente distintos. Nesse sentido as Humanidades não podem 
converter-se em Ciência, nem a Ciência converter-se num ramo dos estudos
 humanísticos.
O senhor afirmou que o grande 
“crime” da nossa época é dizer que o único conhecimento verdadeiro é 
aquele que pode ser medido quantitativamente. Quais são as principais 
conseqüências desse “crime”?
É um crime no sentido de que essas 
aplicações unilaterais do método quantitativo privam o ser humano da sua
 sensibilidade para aspectos incomensuráveis da existência. A principal 
conseqüência é a relativização dos pontos de vista morais. Em vez de nos
 movermos numa perspectiva moral – segundo a qual uma ação é 
intrinsecamente boa, ao passo que outra é intrinsecamente má –, 
caminhamos segundo um modelo behaviorista. Essa é a base do relativismo 
moderno, fundamentado na crença de que existem vários padrões de 
comportamento válidos (ou, como se diz na popular expressão americana, 
vários “estilos de vida alternativos”). A partir daí, já não se fazem 
mais perguntas.
Como o senhor descreveria a atitude da Igreja Católica para com a Ciência, ao longo da História?
A atitude da Igreja para com a Ciência 
foi muito benéfica. Considerada em si mesma, essa atitude não tem porque
 ser útil à Ciência como tal, uma vez que o campo da Igreja não é o 
mundo da Ciência. Como se dizia no tempo de Galileu – e como ele próprio
 afirmou, citando Santo Agostinho – “a razão de ser da Igreja não é 
mostrar às pessoas como o Céu funciona, mas mostrar-lhes como chegar 
lá”.
O que se deve fazer quando as conclusões à que chega a Ciência são contrárias aos ensinamentos da Igreja?
Toda conclusão científica é sempre quantitativa. Como tal, não tem conteúdo moral nem sequer ontológico: o estatuto ontológico está pressuposto (2). Quando um cientista ultrapassa o âmbito próprio da aplicação do método científico, é preciso chamar-lhe a atenção e adverti-lo de que ultrapassou os limites da sua competência. Em outras palavras, quando nos deparamos com conclusões científicas opostas aos ensinamentos da Igreja, não devemos jamais perder a calma. Devemos especificar a natureza das objeções, sejam elas quantitativas ou não. No primeiro caso, não é possível ir contra os ensinamentos da Igreja; no segundo caso, não são objeções científicas: são objeções filosóficas, éticas ou pseudofilosóficas, devendo ser tratadas como tais.
Toda conclusão científica é sempre quantitativa. Como tal, não tem conteúdo moral nem sequer ontológico: o estatuto ontológico está pressuposto (2). Quando um cientista ultrapassa o âmbito próprio da aplicação do método científico, é preciso chamar-lhe a atenção e adverti-lo de que ultrapassou os limites da sua competência. Em outras palavras, quando nos deparamos com conclusões científicas opostas aos ensinamentos da Igreja, não devemos jamais perder a calma. Devemos especificar a natureza das objeções, sejam elas quantitativas ou não. No primeiro caso, não é possível ir contra os ensinamentos da Igreja; no segundo caso, não são objeções científicas: são objeções filosóficas, éticas ou pseudofilosóficas, devendo ser tratadas como tais.
Temos, por exemplo, o caso do aborto. A 
Medicina contemporânea chegou tão longe que é possível realizar um 
aborto sem prejudicar a mãe, desde que seja feito nas primeiras semanas 
da gestação. Isso é um fato médico comprovado. Pois bem, isso não 
significa que o aborto seja moralmente lícito só porque se chegou a esse
 ponto. Analisemos agora um caso de furto. Existem ladrões que agem com 
tal perícia que ninguém percebe o que aconteceu. Será que nesses casos o
 ato deixa de ser considerado um roubo só porque foi realizado com uma 
esperteza exemplar?
Sempre é necessário recorrer a esta 
distinção fundamental: ou falamos simplesmente de quantidades ou então 
estamos fazendo referência a uma série de coisas não mensuráveis, e com 
conteúdo moral.
A EXISTÊNCIA DE DEUS É CIENTIFICAMENTE DEMONSTRÁVEL?
O senhor afirma que as premissas 
filosóficas que servem de partida para o uso criativo do método 
científico são semelhantes às premissas filosóficas a partir das quais é
 possível demonstrar a existência de Deus. É correta, portanto, a 
afirmação de que essas premissas são próprias de ontologias realistas 
(3) e que por isso a Ciência demonstra a existência de Deus?
O método científico não demonstra a 
existência das coisas, muito menos a de Deus. Voltemos à base de tudo. 
Como disse antes, tão logo um cientista afirme que “há um microscópio 
diante de mim”, já está falando como um filósofo, tenha ou não 
conhecimentos de Filosofia. A essência de toda prova da existência de 
Deus está ligada à existência do Universo ou do Cosmos. Se existe um 
Universo – como de fato existe – então a razão para a sua existência só 
pode ser atribuída a um fator externo ao Universo. Esse fator é Deus. 
(Gostaria de indicar que uso o termo Universo no sentido estrito da 
palavra: a soma de tudo. Não pode haver dois Universos: a pluralidade de
 Universos é contraditória em si mesma).
A Ciência moderna – mediante a Teoria da
 Relatividade Geral de Einstein – dispõe de um método não contraditório e
 compatível com a atração gravitacional que se observa em todos os entes
 materiais. Daí segue-se que a noção de Universo, do ponto de vista da 
Ciência, é uma noção legítima. Por que essa conclusão é tão importante? 
Porque Immanuel Kant, em seu ataque ao argumento cosmológico (4), 
declarou que ele não é concludente porque a noção de Universo é uma 
noção falsa. De fato, Kant escreveu que o conceito de Universo é um 
fruto ilegítimo dos desejos metafísicos do intelecto.
Mas os cosmólogos contemporâneos têm, no
 entanto, que basear seus estudos na Teoria da Relatividade Geral de 
Einstein e, portanto, admitir que o Universo é um conceito legítimo do 
ponto de vista científico. Deste modo, a Cosmologia contemporânea 
destrói a objeção de Kant. E mais: a Ciência atual apresenta-nos o 
Universo como algo extremamente concreto, no espaço e no tempo. 
Conseqüentemente – e ao contrário do que Kant afirmava – a Ciência não 
põe dificuldades à formulação de uma pergunta tão própria da Metafísica 
como esta: “Por que o Universo é assim e não de outra maneira?” Qualquer
 pessoa minimamente informada sobre a História do pensamento nos últimos
 séculos poderá perceber que essa contribuição da Ciência ao argumento 
ontológico é de suma importância.
O senhor acredita que as idéias filosóficas de cada cientista influem, ainda que de modo inconsciente, no seu trabalho?
Em todas as épocas – seja no século XIX,
 no século XVIII ou mesmo no século XIII – a maioria dos cientistas 
sempre compartilhou os mesmos pontos de vista com os restantes grupos 
profissionais. É também verdade que as hipóteses empregadas nos 
trabalhos não são, na maior parte dos casos, um reflexo do próprio 
trabalho científico. Quando o são, o que costuma acontecer é o 
aparecimento de formulações muito primitivas das questões filosóficas. É
 portanto difícil que se consiga aprender filosofia através das obras 
dos Prêmios Nobel. Isso é quase tão perigoso quanto tentar buscar uma 
melhor compreensão da obra de Goya num açougue, só porque nos açougues 
podemos encontrar carne ensangüentada.
Hoje em dia poucas coisas são tão 
perigosas ou nocivas como ler obras escritas por pessoas que ganharam o 
Prêmio Nobel de Biologia, Química ou Física e que tentam fazer 
divulgação científica. A leitura desse tipo de obras é ainda mais 
prejudicial quando se procura aprender Ética com elas. Vejamos, por 
exemplo, o livro O acaso e a necessidade, de Jacques Monod (5).
 Nesse livro, o autor não define em nenhum momento o conceito de 
“acaso”. Se o livro já manca, do ponto de vista filosófico logo no 
título, por que lê-lo então? A mesma coisa ocorre nos livros de Ilya 
Prigogine (6) sobre a Filosofia da Ciência. O autor afirma que, como a 
Ciência não pode prever os estados ulteriores nos processos similares ao
 fluxo turbulento, então estes não são produto de nenhuma causa. Esse é 
um argumento filosófico muito pobre.
O livro Uma breve História do Tempo, de Stephen Hawking, teve grande sucesso em todo o mundo. A que isso se deve?
Provavelmente ao fato de que o ambiente 
cultural contemporâneo está marcado pelo agnosticismo e pelo ateísmo. Em
 ambientes assim, as pessoas buscam na Ciência a confirmação de que Deus
 não existe. Afinal, se não há Deus, pode-se fazer o que quiser; e isso é
 muito reconfortante para um agnóstico ou para um materialista. Quando 
chegamos a esse ponto, só nos resta uma pluralidade de modelos ou 
estilos de vida alternativos, que cada um escolhe conforme mais lhe 
convenha.
A DIFERENÇA ENTRE O QUANTITATIVO E O QUALITATIVO
Qual a sua opinião sobre o fato de muitos cientistas aceitarem a interpretação de Copenhague (7) para a Mecânica Quântica?
Essa interpretação é uma falácia. 
Baseia-se na premissa de que se uma ação intermediária não pode ser 
medida com exatidão, então não pode produzir-se com exatidão. É uma 
falácia porque na primeira parte da premissa a palavra exatidão é usada 
em sentido operacional, e na segunda parte é usada em sentido 
ontológico. Isso é errôneo, porque os dois campos não se relacionam.
Muito antes de Heisenberg (8) formular o
 Princípio da Incerteza, em 1927, e de dar-lhe essa interpretação 
anticausal, muitos físicos de renome, entre eles o próprio Heisenberg, 
já haviam rejeitado o princípio da causalidade em outros campos. O que 
aconteceu foi que, em vez de encontrarem na Ciência uma demonstração ou 
refutação da causalidade, o que encontraram foi uma maneira de recobrir 
de cientificismo a sua descrença na causalidade. Um disfarce como esse e
 uma demonstração científica são coisas bem diferentes.
Procurou-se uma aparência científica 
porque a mentalidade da cultura moderna está baseada no pragmatismo e no
 relativismo. Tal mentalidade busca recompensas imediatas e tenta 
ignorar as conseqüências a longo prazo (que inexoravelmente ocorrerão, 
pois há causalidade) das ações individuais. Para poder sustentar essa 
mentalidade é necessário adotar um ponto de vista segundo o qual as 
coisas parecem não ter coerência. A aparência de cientificismo que 
encobre a rejeição da causalidade é o sustentáculo dessa reivindicação 
pseudocultural de incoerência entre as coisas e as ações.
Em outras palavras, segundo essa 
perspectiva, a vida tem por fim passar por muitos momentos imediatamente
 gratificantes, sem que seja preciso pensar na relação entre uns 
momentos e outros, nem tampouco nas suas conseqüências. Dito de outro 
modo: deve-se ter em conta que a mentalidade atual está doente por causa
 do pecado original, como sempre esteve e sempre estará. Sejam quais 
forem os argumentos que usemos, o mundo continuará a manter uma certa 
mentalidade negativa diante dos argumentos filosóficos puros e da 
religiosidade sincera.
Que diferença há entre a mente humana e um computador sumamente perfeito?
Se considerarmos que a mente humana 
equivale ao cérebro – que é um conjunto de moléculas – então é possível 
estabelecer um paralelismo entre o cérebro e um computador. Mas quem 
demonstrou que a mente se reduz ao cérebro? Se “tudo” é assunto próprio 
da mente humana, então como a mente pode chegar à idéia de “nada”? Ou 
ainda, como a mente pode chegar a formular funções matemáticas que não 
podem ser expressas em termos quantitativos exatos, tais como a 
tendência ao infinito no cálculo integral, ou o reino dos números 
irracionais e imaginários? Se a mente é meramente um conjunto de 
moléculas, como se explica que chegue a tais noções, e de modo especial à
 noção de nada? O nada é uma das mais espetaculares invenções do poder 
metafísico da mente humana. Quando escrevemos essa palavra, ela 
converte-se em algo, mas apesar disso continua a significar “nada”. Se a
 mente humana reduz-se ao cérebro, fica impossível tratar de coisas tão 
essenciais para a vida da mente como as abstrações (que estão implícitas
 em todas as palavras) e os fatos da vida espiritual.
O que a Ciência tem a dizer sobre a Evolução biológica?
A Ciência pode declarar que houve um 
passado biológico de pelo menos 3 bilhões de anos. Pode estabelecer que 
há uma certa sucessão entre as várias espécies e gêneros. Mas quando a 
Ciência emprega termos como “espécies”, “gêneros” e “filos”, traz à 
baila os poderes metafísicos da mente. Ninguém pode ver os diferentes 
reinos animais nem as espécies. Noções como essas, tão essenciais para a
 Biologia evolutiva, são todas elas generalizações. A Biologia evolutiva
 está repleta de conceitos metafísicos.
Mais ainda: a Ciência biológica não pode
 dizer nada a respeito da finalidade da Evolução. Antes de mais nada, a 
Ciência não demonstrou empiricamente a origem de uma espécie a partir de
 outra. Quando eu aceito a Evolução, coisa que aliás faço partindo dos 
poderes metafísicos da minha mente, considero-a como um reflexo 
maravilhoso desses mesmos poderes metafísicos. O método científico de 
modo algum pode me dizer qual é o rumo ou o propósito da Evolução. Além 
disso, o que sem dúvida alguma não me interessa para nada é uma Evolução
 baseada em probabilidades, pois probabilidade é um outro modo de dizer 
ignorância. A palavra probabilidade já deveria ter sido há muito tempo 
eliminada do vocabulário filosófico e científico.
Por que os teoremas de Gödel (9) sobre a inconsistência são tão importantes?
Considerados em si mesmos, tais teoremas
 afirmam apenas que a Matemática não pode ser considerada como um 
conjunto de proposições verdadeiras a priori e, portanto, 
necessárias. Isso no entanto acarreta uma importante conseqüência para a
 Cosmologia científica, que é em parte empírica e em parte teórica. Do 
ponto de vista teórico, a Cosmologia científica tem muito de Matemática,
 e por isso nenhuma expressão da Cosmologia científica pode ser tomada 
como sendo necessariamente certa, com base em sua simplicidade 
matemática. Apesar disso, alguns cosmólogos modernos (como Hawking, por 
exemplo) têm esperanças de encontrar alguma teoria cosmológica que 
demonstre que o Universo tem que ser necessariamente o que é e como é. 
Um Universo que existe necessariamente não necessita de um Criador. 
Agora já deve ter ficado clara a importância dos teoremas de Gödel, uma 
vez que tornam impossível sustentar o principal princípio do paganismo 
clássico e moderno, a saber: que o Universo é o Ser primordial.
Além do mais, se o Universo – que é a 
totalidade das coisas – não pode ser considerado como a coisa mais 
primária ou essencial, então fica aberto o caminho para a busca 
filosófica e teológica desse Princípio, que é o Criador do Universo. Ou 
existimos necessariamente ou somos criados. A terceira alternativa, a de
 que somos fruto do acaso, não merece nem ser considerada. O acaso é 
sinônimo da nossa ignorância: foi o que muitos sábios já apontaram, 
entre eles o Cardeal Newman (no ano passado – 1990 – celebramos o 
centenário da sua morte). Newman estava muito próximo ao núcleo central 
dessa nossa conversa quando escrevia: “Só existe um pensamento maior do 
que o próprio Universo, e esse pensamento é o do seu Criador”.
Notas
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(1) James Clerk Maxwell (1831-1879): físico escocês, um dos mais importantes do século XIX. Fez contribuições ao estudo dos gases, mas os seus trabalhos mais importantes concentram-se no campo do eletromagnetismo, em que desenvolveu as célebres equações para os campos magnéticos e a sua teoria eletromagnética da luz.
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(1) James Clerk Maxwell (1831-1879): físico escocês, um dos mais importantes do século XIX. Fez contribuições ao estudo dos gases, mas os seus trabalhos mais importantes concentram-se no campo do eletromagnetismo, em que desenvolveu as célebres equações para os campos magnéticos e a sua teoria eletromagnética da luz.
(2) Ontologia é a disciplina filosófica 
que trata das questões relacionadas ao ser das coisas. O autor quer 
dizer aqui que o método científico é incapaz de responder questões 
morais (“Isso é bom ou mau?”) e ontológicas (“O que é isto na sua mais 
profunda essência?”, “Por que isto existe, se é que existe?”).
(3) Ontologia realista é toda a ontologia que afirma que o homem é capaz de conhecer a essência
 das coisas, ou seja, a realidade que está por trás dos seus aspectos 
sensíveis, dando-lhe ordem. Em contraposição a ontologia realista, 
existe a ontologia imanentista, cujo maior expoente é Kant. 
Segundo esse tipo de ontologia, o homem é incapaz de conhecer a essência
 das coisas, de dizer com precisão o que determinada coisa é.
(4) O argumento cosmológico é uma das 
vias demonstradas por São Tomás de Aquino para provar a existência de 
Deus através da razão. O argumento postula que as coisas que existem são
 sempre efeitos de uma causa, como o homem pode perceber através da 
contemplação do Universo. A procura das causas últimas de cada efeito 
leva o homem necessariamente à descoberta de uma Causa Primeira, que não
 é efeito de nada. Essa causa é Deus. Como o entrevistado menciona 
acima, a impossibilidade de conhecer o Universo conduziria a uma 
impossibilidade de conhecer Deus através da razão.
(5) Jacques Monod (1910-1976), 
bioquímico francês, recebeu o Prêmio Nobel de Química por sua explicação
 do mecanismo de regulação genética nas células. Argumenta na sua obra O acaso e a necessidade (1970) que o ser humano seria um mero fruto do acaso, rejeitando assim qualquer noção de um Deus Criador.
(6) Ilya Prigogine (1917): químico 
belga, nascido na ex-União Soviética, recebeu o prêmio Nobel de Química 
em 1977 por seus trabalhos em Termodinâmica.
(7) A entrevistadora refere-se à 
interpretação da mecânica quântica formulada por Niels Bohr (1885-1962) e
 seus companheiros da Universidade de Copenhague. Uma das bases dessa 
interpretação é a idéia de que a observação de um experimento interfere 
nos seus resultados. A mecânica quântica estuda o movimento dos átomos e
 das partículas subatômicas.
(8) Werner Karl Heisenberg (1901-1976): 
físico alemão, recebeu o prêmio Nobel de Física em 1932 por suas 
contribuições à mecânica quântica. O seu Princípio da Incerteza
 postula que não se pode medir simultaneamente e com exatidão a posição e
 a velocidade de um átomo ou de uma partícula subatômica.
(9) Kurt Gödel (1906-1978), matemático 
austríaco naturalizado norte-americano, célebre por ter provado que é 
impossível realizar a completa axiomatização da matemática proposta por 
David Hilbert. Os Teoremas da Indecidibilidade (também conhecidos como 
Teoremas da Incompletude), provam que em todo sistema formal 
suficientemente grande (a aritimética, por exemplo) sempre existirá uma 
proposição bem formada para qual será impossível atribuir tanto o valor 
de verdadeiro quanto o valor de falso. (N. do E.).
Fonte: Quadrante
*Extraído da entrevista originalmente publicada na revista Atlántida, janeiro/março de 1991, pp. 76-82.
Stanley L. Jaki nasceu na Hungria em 1924. É Doutor em Teologia (Istituto Pontificio di S. Anselmo) e em Física (Fordham University), professor Emérito da Universidade de Seton Hall (Nova Jersey), Doutor Honoris Causa por sete Universidades e membro da Pontifícia Academia de Ciências do Vaticano. Recebeu por suas publicações os prêmios Lecomte de Nouy (1970) e Templeton (1987), além de distinções por parte de algumas das mais renomadas universidades do mundo, como Oxford e Yale.
Stanley L. Jaki nasceu na Hungria em 1924. É Doutor em Teologia (Istituto Pontificio di S. Anselmo) e em Física (Fordham University), professor Emérito da Universidade de Seton Hall (Nova Jersey), Doutor Honoris Causa por sete Universidades e membro da Pontifícia Academia de Ciências do Vaticano. Recebeu por suas publicações os prêmios Lecomte de Nouy (1970) e Templeton (1987), além de distinções por parte de algumas das mais renomadas universidades do mundo, como Oxford e Yale.
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