terça-feira, 18 de janeiro de 2011

A Educação Católica


Texto retirado do livro: Documento de Aparecida – texto conclusivo da V Conferência Geral do Episcopado Latino-
Americano e do Caribe (13-31 de maio de 2007) – Editora Paulinas – páginas 149-154.
A América Latina e o Caribe vivem uma particular e delicada emergência
educativa. Na verdade, as novas formas educacionais de nosso
continente, impulsionadas para se adaptar às novas exigências que se
vão criando com a mudança global, aparecem centradas prioritariamente
na aquisição de conhecimentos e habilidades e denotam claro
reducionismo antropológico, visto que concebem a educação
preponderantemente em função da produção, da competitividade e do
mercado. Por outro lado, com freqüência, elas propiciam a inclusão de
fatores contrários à vida, à família e a uma sadia sexualidade. Dessa
forma, não manifestam os melhores valores dos jovens nem se espírito
religioso; menos ainda lhe ensinam os caminhos para superar a violência e se aproximar
e se aproximar da felicidade, nem os ajudam a levar uma vida sóbria e adquirir as
atitudes, virtudes e costumes que tornariam estável o lar que venham a estabelecer, e
que os converteriam em construtores solidários da paz e do futuro da sociedade.
Diante desta situação, fortalecendo a estreita colaboração com os pais de família e
pensando em uma educação de qualidade à que têm direito, sem distinção, todos os
alunos e alunos de nossos povos, é necessário insistir no autêntico fim de toda escola. É
chamada a se transformar, antes de mais nada, em lugar privilegiado de formação e
promoção integral, mediante a assimilação sistemática e crítica da cultura, fato que
consegue mediante um encontro vivo e vital com o patrimônio cultural. Isso supõe que tal
encontro se realize na escola em forma de elaboração, ou seja, confrontando e inserindo
os valores perenes no contexto atual. Na realidade, a cultura, para ser educativa, deve
inserir-se nos problemas do tempo no qual se desenvolve a vida do jovem. Dessa
maneira, as diferentes disciplinas precisam apresentar não só um saber por adquirir, mas
valores por assimilar e verdades por descobrir.
Constitui responsabilidade estrita da escola, enquanto instituição educativa, destacar a
dimensão ética e religiosa da cultura, precisamente com o objetivo de ativar o dinamismo
espiritual do sujeito e ajudá-lo a alcançar a liberdade ética que pressupõe e aperfeiçoa a
psicológica. Mas não se dá liberdade ética, a não ser na confrontação com os valores
absolutos dos quais dependem o sentido e o valor da vida do ser humano. Inclusive no
âmbito da educação, manifesta-se a tendência de assumir a realidade como parâmetro
dos valores, correndo dessa forma o perigo de responder a aspirações secundárias e
superficiais, e perder de vista as exigências mais profundas do mundo contemporâneo (E.
C. 30). A educação humaniza e personaliza o ser humano quando consegue que este
desenvolva plenamente seu pensamento e sua liberdade, fazendo-o frutificar em hábitos
de compreensão e em iniciativas de comunhão com a totalidade de ordem real. Dessa
maneira, o ser humano humaniza seu mundo, produz cultura, transforma a sociedade e
constrói a história.
Os centros educativos católicos:
A missão primária da Igreja é anunciar o Evangelho de maneira tal que garanta a relação
entre a fé e a vida tanto na pessoa individual como no contexto sócio-cultural em que as
pessoas vivem, atuam e se relacionam entre si. Assim, a Igreja “procura transformar,
mediante a força do Evangelho, os critérios de juízo, os valores determinantes, os pontos
de interesse, as linhas de pensamento, as fontes inspiradoras e os modelos de vida da
humanidade que estão em contraste com a Palavra de Deus e o desígnio de salvação”.
Portanto, quando falamos de educação cristã, entendemos que o mestre educa para um
projeto de ser humano em que habite Jesus Cristo com o poder transformador de sua vida
nova. Existem muitos aspectos nos quais se educa e entre os quais consta o projeto
educativo. Existem muitos valores, mas estes valores nunca estão sozinhos, sempre
formam uma constelação ordenada, explícita ou implicitamente. Se a ordenação tem a
Cristo como fundamento e fim, então essa educação está recapitulando tudo em Cristo e
é verdadeira educação cristã; se não, pode falar de Cristo, mas corre o perigo de não ser
cristã.
Desse modo se produz uma compenetração entre os dois aspectos. Quer dizer, não se
concebe a possibilidade de anunciar o Evangelho sem que este ilumine, infunda alento e
esperança e inspire soluções adequadas aos problemas da existência; muito menos que
se posso pensar em verdadeira e plena promoção do ser humano sem abri-lo a Deus e
anunciar-lhe Jesus Cristo.
A Igreja é chamada a promover em suas escolas uma educação centrada na pessoa
humana que é capaz de viver na comunidade oferecendo a esta o bem que a Igreja
possui. Diante do fato de que muitos se encontram excluídos, a Igreja deverá estimular
uma educação de qualidade para todos, formal e não-formal, especialmente para os mais
pobres. Educação que oferece às crianças, aos jovens e aos adultos o encontro com os
valores culturais do próprio país, descobrindo ou integrando neles a dimensão religiosa e
transcendente. Para isso, necessitamos de uma pastoral da educação que seja dinâmica
e acompanhe os processos educativos, que seja voz que legitime e salvaguarde a
liberdade de educação diante do Estado e o direito a uma educação de qualidade para os
mais despossuídos.
Desse modo, estamos em condições de afirmar que, no projeto educativo da escola
católica, Cristo, o Homem perfeito, é o fundamento em quem todos os valores humanos
encontram sua plena realização e, a partir daí, sua unidade. Ele revela e promove o
sentido novo da existência e a transforma, capacitando o homem e a mulher a viverem de
maneira divina, ou seja, para pensar, querer e agir segundo o Evangelho, fazendo das
bem-aventuranças a norma de suas vidas. Precisamente pela referência explícita e
compartilhada por todos os membros da comunidade escolar, a visão cristã – ainda que
em grau diverso, e respeitando a liberdade de consciência e religiosa dos não cristãos
presentes nela – a educação é “católica”, pois os princípios evangélicos se convertem
para ela em normas educativas, motivações interiores e, ao mesmo tempo, em metas
finais. Esse é o caráter especificamente católico da educação. Jesus Cristo, pois, eleva e
enobrece a pessoa humana, dá valor à sua existência e constitui o perfeito exemplo de
vida. É a melhor notícia, proposta pelos centros de formação católica aos jovens.
Portanto, a meta que a escola católica se propõe com relação às crianças e jovens, é a de
conduzir ao encontro com Jesus Cristo vivo, Filho do Pai, irmão e amigo, Mestre e Pastor
misericordioso, esperança, caminho, verdade e vida, e dessa forma à vivência da aliança
com Deus e com os homens. A escola o faz colaborando na construção da personalidade
dos alunos, tendo Cristo como referência no plano da mentalidade e da vida. Tal
referência, ao se fazer progressivamente explícita e interiorizada, ajudará a ver a história
como Cristo a vê, a julgar a vida como Ele o faz, a escolher e amar com Ele, a cultivar a
esperança como Ele nos ensina e a viver nEle a comunhão com o Pai e o Espírito Santo.
Pela fecundidade misteriosa dessa referência, a pessoa se constrói na unidade
existencial, isto é, assume suas responsabilidades e procura o significado último de sua
vida. Situada na Igreja, comunidade de cristãos, ela consegue com liberdade viver
intensamente a fé, anunciá-la e celebrá-la com alegria na realidade de cada dia. Como
conseqüência, amadurecem e aparecem conaturais as atitudes humanas que levam a se
abrir sinceramente à verdade, a respeitar e amar as outras pessoas, a expressar sua
própria liberdade na doação de si e no serviço aos demais para a transformação da
sociedade.
A Escola católica é chamada a uma profunda renovação. Devemos resgatar a identidade
católica de nossos centros educativos por meio de um impulso missionário corajoso e
audaz, de modo que chegue a ser uma opção profética plasmada em uma pastoral da
educação participativa. Tais projetos devem promover a formação integral da pessoa,
tendo seu fundamento em Cristo, com identidade eclesial e cultural, e com excelência
acadêmica. Além disso, há de gerar solidariedade e caridade para com os mais pobres. O
acompanhamento dos processos educativos, a participação dos pais de família neles e a
formação de docentes, são tarefas prioritárias da pastoral educativa.
Propõe-se que nas instituições católicas a educação na fé seja integral e transversal em
todo o currículo, levando em consideração o processo de formação para encontrar a
Cristo e para viver como discípulos e missionários e inserindo nela verdadeiros processos
de iniciação cristã. Ao mesmo tempo, recomenda-se que a comunidade educativa
(diretores, mestres, pessoal administrativo, alunos, pais de família etc.), enquanto
autêntica comunidade eclesial e centro de evangelização, assuma seu papel de
formadora de discípulos e missionários em todo os seus estratos. Que, a partir daí, em
comunhão com a comunidade cristã que é a sua matriz, promova um serviço pastoral no
setor em que se insere, especialmente dos jovens, da família, da catequese e da
promoção humana dos mais pobres. Esses objetivos são essenciais nos processos de
admissão de alunos, em suas famílias e na contratação dos docentes.
Um princípio irrenunciável para a Igreja é a liberdade de ensino. O amplo exercício do
direito à educação reivindica por sua vez, como condição para sua autêntica realização, a
plena liberdade que deve gozar toda pessoa para escolher a educação de seus filhos que
considere mais adequada aos valores que eles mais estimam e que consideram
indispensáveis. Pelo fato de haver dado a vida aos filhos, os pais assumiram a
responsabilidade de oferecer a eles condições favoráveis para seu crescimento e a séria
obrigação de educá-los. A sociedade precisa reconhecê-los como os primeiros e
principais educadores. O dever da educação familiar, como primeira escola de virtudes
sociais, é de tanta transcendência que, quando falta, dificilmente pode ser suprida. Esse
princípio é irrenunciável.
Esse direito intransferível, que implica uma obrigação e que expressa a liberdade da
família na esfera da educação, por seu significado e alcance, precisa ser decididamente
garantido pelo Estado. Por esta razão, o poder público, a quem compete a proteção e a
defesa das liberdades dos cidadãos, atendendo à justiça distributiva, deve distribuir as
ajudas públicas – que provêm dos impostos de todos os cidadãos – de tal maneira que a
totalidade dos pais, independente de sua condição social, possam escolher, segundo sua
consciência, em meio a uma pluralidade de projetos educativos, as escolas adequadas
para seus filhos. Esse é o valor fundamental e a natureza jurídica que fundamenta a
subvenção escolar. Portanto, a nenhum setor educacional, nem sequer ao próprio Estado,
se pode outorgar a faculdade de se reservar o privilégio e a exclusividade da educação
dos mais pobres, sem com isso infringir importantes direitos. Desse modo, promovem-se
direitos naturais da pessoa humana, da convivência pacífica dos cidadãos e do progresso
de todos.

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