1. O que restou, vinte anos depois, da tese controversa de Fukuyama?
No verão de 1989, a revista americana National Interest
 publicava um ensaio teórico – mais exatamente de filosofia da História –
 do intelectual nipo-americano Francis Fukuyama sobre os sinais – até 
então simplesmente anunciadores – do fim da Guerra Fria, cujo título 
estava destinado a deslanchar um debate ainda hoje controverso: “The End
 of History?”.[1]
 Vinte anos depois, em vista das muitas críticas feitas naquela 
conjuntura – e ainda hoje –  às principais teses do autor, vale a pena 
retomar seus principais argumentos e verificar se eles ainda conservam 
alguma validade para nossos tempos, que poderiam ser considerados como 
de pós-Guerra Fria, mas que alguns interpretam, ou consideram 
efetivamente, como de volta à Guerra Fria, ainda que sob novas 
modalidades (com uma Rússia singularmente diminuída e uma China 
hesitante em se posicionar como contendor estratégico dos Estados 
Unidos).
Antes, contudo, de ingressar numa 
descrição linear desses argumentos, qualquer que seja sua validade 
relativa ou absoluta para o tema que nos interessa – qual seja, o da 
natureza das opções abertas aos países em termos de reforma e 
desenvolvimento paralelos do sistema econômico e do  regime político, 
que Fukuyama identificava com a redução dessas opções à democracia de 
mercado – cabe chamar a atenção para uma peculiaridade geralmente 
descurada no debate anterior (e talvez atual) sobre a validade das teses
 de Fukuyama, sobretudo por aqueles que recusavam, in limine, a
 essência mesma do argumento do autor. Esta peculiaridade tem a ver, 
basicamente, com um simples sinal diacrítico: o ponto de interrogação ao
 final do título, geralmente ignorado pelos críticos das teses de 
Fukuyama, e provavelmente também por aqueles que apóiam, em grande 
medida, o sentido dos seus argumentos. Ou seja, Fukuyama não fazia uma 
afirmação peremptória, mas levantava uma hipótese, a do final presumido 
da história, numa análise de corte essencialmente conceitual, ainda que 
fortemente embasada nos fatos históricos, e nunca pretendeu formular uma
 sentença de caráter terminativo, indicando um “congelamento” das formas
 possíveis de organização social, econômica e política. O interrogante 
básico de seu argumento tem a ver com a possibilidade de alternativas 
credíveis às democracias liberais de mercado, ponto.
O ponto de interrogação, por si só, tem o
 poder de desmantelar boa parte das críticas superficiais, embora ele 
não elimine uma discussão responsável sobre a essência de sua tese, que 
caberia discutir, após o resumo inicial de seus argumentos. A tese – 
vale a pena resumir desde o início – tem a ver com o caráter 
incontornável da democracia de mercado como sendo uma espécie de 
‘horizonte insuperável de nossa época’, como poderia argumentar – mas a 
propósito do marxismo – Jean Paul Sartre, um dos estudantes, junto com 
Raymond Aron, da tese original de Hegel, através de Alexandre Kojève.
2. O que Fukuyama de fato escreveu?
A tese principal era a de que, após um 
século de emergência e declínio dos regimes fascistas e comunistas, de 
enormes turbulências políticas e de crises econômicas, de contestação 
intelectual e prática ao liberalismo econômico e político de corte 
ocidental, o mundo estava retornando ao seu ponto inicial, qual seja o 
do triunfo inquestionável – an unabashed victory, nas palavras 
de Fukuyama – do sistema liberal ocidental. Segundo ele, tratava-se de 
um triunfo da “idéia ocidental”, tornada evidente pela exaustão das 
alternativas viáveis ao liberalismo ocidental. Esse triunfo era 
mostrado, em primeiro lugar, pela disseminação da cultura consumista 
ocidental nos dois países mais importantes do ‘mundo alternativo’, a 
China e a União Soviética (cabe registrar, imediatamente, que em nenhum 
momento de sua análise, Fukuyama esperava a dissolução imediata do 
regime monocrático e o rápido desaparecimento do próprio império 
soviético). Como ele mesmo observou logo ao início do artigo, “a vitória
 do liberalismo ocorreu primariamente no domínio das idéias, ou da 
consciência, e é ainda incompleto do mundo real ou material”.
Mas como afirmou, logo em seguida, o 
próprio Fukuyama, “há razões poderosas para acreditar que é essa idéia 
que irá governar o mundo real no longo prazo” (ênfase 
original). Se aceitarmos o conhecido aforismo keynesiano, segundo o 
qual, a longo prazo, todos estaremos mortos, essa afirmação do cientista
 político americano o deixa inteiramente à vontade para acomodar 
quaisquer desenvolvimentos políticos e econômicos imediatos e de médio 
prazo, retirando sua responsabilidade sobre a validade de sua tese na 
perspectiva do cenário de curto prazo. Esse fato pode transformar sua 
tese principal no equivalente acadêmico dessas previsões de cartomantes 
ou adivinhos, que deixam a um futuro indefinido a realização de seus 
exercícios de futurologia amadora, mas caberia aceitar, em princípio, as
 premissas de Fukuyama como uma proposta passível de discussão apoiada 
em metodologia rigorosa.
Em todo caso, seu texto engajava, a 
partir daí, uma discussão em torno das questões teóricas relativas à 
natureza da mudança histórica, processo que ele remonta a Hegel e Marx, 
sobretudo o primeiro, formulador da teoria do progresso na história 
universal.[2]
 O fim da história, na concepção hegeliana (tal como interpretada por 
Kojève), estava identificado com a afirmação dos princípios do direito 
universal à liberdade e da legitimação de um sistema de governo apenas 
com o consentimento e a aprovação explícita dos governados, o que foi 
chamado de “Estado homogêneo universal”. Uma vez que todas as 
contradições anteriores já teriam sido resolvidas com a aceitação e por 
meio do estabelecimento desse Estado – e como, para Hegel, o mundo real 
deveria corresponder ao mundo ideal, pelo menos aquele que figurava na 
cabeça do filósofo –, então não existiriam mais espaços para conflitos 
de maior escopo em torno da organização política desse Estado, restando 
apenas encaminhar e resolver os pequenos problemas da atividade 
econômica e da política corrente. O mundo se converteria, então, numa 
simples “administração das coisas”, segundo a frase de Engels para 
representar a situação das sociedades humanas na fase pós-socialista, 
quando supostamente já não mais existiriam a exploração dos 
trabalhadores e a dominação política sobre os homens.
Obviamente, Hegel não era tão simplista 
como a exposição acima poderia sugerir, sobretudo com esse ‘idealismo 
filosófico’ de equalizar o mundo ideal ao mundo real. Para o filósofo 
alemão – mais especificamente prussiano, talvez –, as contradições 
existentes no mundo real se formam a partir de um conflito de idéias, ou
 seja, de diferentes concepções sobre como deveria ser organizado o 
mundo real da política e da economia. As distinções entre um mundo e 
outro seriam apenas aparentes, posto que as idéias que encontravam 
abrigo na consciência dos homens acabariam por se tornar necessidades do
 mundo real, fechando assim o ciclo de realização da idéia universal.[3]
A consequência prática dessa concepção 
seria a de que, posto que as democracias de mercado provaram sua 
capacidade de não apenas resistir aos desafios colocados por crises 
econômicas e por guerras devastadoras, mas também de atender aos 
requerimentos suscetíveis de trazer prosperidade e riqueza a todos os 
países que aderiram a seus princípios organizadores, elas estavam 
habilitadas a cumprir seu mandato hegeliano de realizar o ‘Estado 
universal homogêneo’, fechando, assim, um ciclo completo da história. À 
pergunta – sempre o ponto de interrogação – de saber se chegamos ao fim 
da história, deve-se agregar esta outra, sobre se existem contradições 
tão fundamentais na vida humana que não possam ser encaminhadas através 
de qualquer outra forma alternativa de estrutura político-econômica que 
não o liberalismo moderno de mercado. Não se trata de saber o que pode 
ocorrer, em termos práticos, na Albânia ou em Burkina Faso, mas o que 
importa, realmente, em termos de ‘herança ideológica comum da 
humanidade’.
Como indica corretamente Fukuyama, no 
decorrer do século 20, foram dois os desafios mais importantes ao 
liberalismo político e econômico: o fascismo e o comunismo. Ambos 
poderiam, na verdade, ser abrigados sob o conceito comum de regimes 
anti- ou aliberais, no terreno político, e sob o conceito de sistemas 
coletivistas no domínio econômico (embora o comunismo, ou o socialismo 
soviético, tenha sido muito mais ‘coletivista’ do que o fascismo). Tendo
 este último sido enterrado sob os escombros da Segunda Guerra Mundial, 
restava o comunismo, que, no momento em que Fukuyama redigia seu 
panfleto hegeliano, ainda não tinha sido enterrado de vez. Essa 
recordação é importante: afinal de contas, na segunda metade de 1988 e o
 início de 1989, quando Fukuyama redigiu seu ensaio especulativo, 
Gorbachev ainda se debatia para implementar sua glasnost e sua perestroika,
 destinadas, como se sabe, não a enterrar o comunismo, mas a introduzir 
elementos de mercado em seu funcionamento efetivo, de maneira que a nova
 NEP sob o comando de um reformista do Partido Comunista pudesse 
assegurar a continuidade do sistema e do império; por outro lado, a 
China de Deng Xiao-Ping exibia, naquela conjuntura, apenas 20% de 
sistema de mercado como locus da produção global do país e, ao 
que se sabe, a plutocracia do PCC pretende, até hoje, construir um 
fantasmagórico “socialismo de mercado com características chinesas”.[4]
Fukuyama não deixa de ironizar o fato de
 que entre os maiores opositores do marxismo e das economias 
coletivistas nos países ocidentais estão os ‘perfeitos materialistas’ de
 Wall Street, que cultivam o mais acirrado anticomunismo e não deixam de
 ser defensores de princípios similares aos dos marxistas. Como ele 
escreve: “A inclinação materialista do pensamento moderno é uma 
característica não apenas do pessoal da Esquerda, que podem ser 
simpáticos ao Marxismo, mas de muitos antimarxistas passionais também. 
De fato, existe na direita o que se poderia rotular de escola do Wall Street Journal
 do materialismo determinista, que relativiza a importância da ideologia
 e da cultura e vê o homem como sendo essencialmente um indivíduo 
racional, maximizador dos lucros. É precisamente esse tipo de indivíduo e
 a sua busca de incentivos materiais que aparece como a base da vida 
econômica nos manuais de economia.”
Não se trata de mera ironia gratuita, pois como lembra em seguida Fukuyama, é essa mesma escola do materialismo determinista de Wall Street Journal
 que aponta para os notáveis sucessos de países dinâmicos da Ásia nas 
últimas décadas como uma evidência da viabilidade da economia de 
mercados livres, com a implicação decorrente de que todas as sociedades 
poderiam conhecer desenvolvimentos similares se elas simplesmente 
deixassem as pessoas perseguirem livremente seus interesses materiais. O
 próprio Fukuyama aponta para os elementos “ideais” presentes nessa 
transformação e na ulterior transição do socialismo ao capitalismo, ao 
dizer que os dirigentes dessas fracassadas experiências do socialismo 
real já tinham constatado há muito tempo que o sistema simplesmente não 
funcionava. Registre-se que Fukuyama escrevia antes que o socialismo 
implodisse de fato e que os chineses formalizassem sua receita original 
de transição do socialismo ao capitalismo, com as justificativas 
teóricas disponíveis, o que foi feito apenas a partir de 1991-92.
3. Fukuyama tinha razão?
Na terceira parte de seu ensaio, 
Fukuyama se pergunta se atingimos, de fato, o fim da história. “Existem,
 em outras palavras, quaisquer ‘contradições’ fundamentais na vida 
humana que não possam ser resolvidas no contexto do liberalismo moderno,
 e que poderiam ser solucionadas por uma estrutura político-econômica 
alternativa? Se aceitarmos as premissas idealistas expostas acima, 
precisaremos buscar uma resposta a esta questão no terreno da ideologia e
 da consciência.” Seria verdade essa firmação de Fukuyama, em sua época e
 ainda hoje?
A proposta de Fukuyama sobre o “fim da 
História”, apresentada com um suporte hegeliano aparentemente 
consistente, é de tão fácil aceitação, do ponto de vista intelectual, 
quanto desprovida de maior importância explicativa, do ponto de vista 
prático. Em sua roupagem puramente acadêmica, ela oferece um excelente 
terreno de manobras para divagações ‘inocentes’ sobre o “triunfo 
definitivo” do liberalismo ocidental. Quando se trata, no entanto, de – 
parafraseando a décima-primeira tese de Marx sobre Feuerbach – não mais 
“interpretar” o mundo, simplesmente, mas de “transformá-lo”, 
verdadeiramente, essa nova tese ‘jovem hegeliana’ perde-se em seu 
próprio ‘pântano’ ideológico.
Em outros termos, se a História 
realmente aproxima-se de seu final filosófico — isto é, se a Razão 
exauriu as possibilidades conceituais de explicar o Real — e se a 
organização formal do mundo material confunde-se com sua atual 
configuração histórica, isto não quer dizer que a história esteja perto 
de seu final concreto — isto é, que o Real tenha esgotado de vez as 
possibilidades práticas de ordenar o mundo em conformidade com o reino 
da Razão — ou que a organização material do mundo potencial esteja 
limitada a um determinado sistema sócio-político. Sem dúvida alguma, 
muito ainda resta a ser feito para que o homem comum possa trabalhar 
pela manhã, pescar na hora do almoço e dedicar-se à filosofia pela 
tarde, como queria o Marx hegeliano da juventude. Em todo caso, a maior 
parte da humanidade não foi ainda advertida sobre essas novas 
possibilidades de épanouissement individuel.
Para ser honesto com Fukuyama, sua tese é
 basicamente correta em sua aparente simplicidade propositiva: não há 
mais contestação ideológica possível – de origem ‘socialista’, 
entenda-se bem – à hegemonia filosófica, política e econômica do 
liberalismo ocidental. Este último emergiu claramente vencedor das 
contendas ideológicas do período de Guerra Fria; mas não apenas 
ideológicas, as práticas também: com efeito, o socialismo não foi 
‘derrotado’ pelo capitalismo, de qualquer forma concreta e visível, ele 
simplesmente implodiu pela sua absoluta incapacidade de produzir, não 
mísseis nucleares, mas meias de nylon. Parodiando o autor da Critique de la Raison Dialectique, até se poderia adivinhar a brincadeira outre-tombe
 que, a propósito do liberalismo ocidental, Aron dirigiria contra 
Sartre: à diferença do marxismo, ela, sim, a economia liberal de 
mercado, teria se tornado o “horizonte insuperável de nossa época”.
É altamente improvável, porém, que Aron concordasse com a previsão de Fukuyama sobre os états d’âme associados a um liberalismo fin-de-siècle: uma clara época de tédio (a very sad time, prospects of centuries of boredom,
 como diz Fukuyama), marcada pela preocupação quase que exclusiva com 
exigências materiais, sem as experiências ‘heróicas’ ou ‘excitantes’ que
 todo período maniqueísta sabe suscitar. Relativamente pessimista – 
dotado de um scepticisme serein, preferiria dizer ele mesmo – 
no que se refere às realidades dos Estados e dos sistemas de poder 
existentes, Aron não alimentaria nenhuma ilusão quanto a que o alegre 
‘enterro do socialismo’ operado na última década do século 20 pudesse 
conduzir a uma ‘primavera das democracias’ razoavelmente estável ou a 
uma versão atualizada da ‘paz universal’ prometida em meados do século 
18 por um prelado francês, e um pouco mais tarde pelo próprio Kant.[5]
Em todo caso, a anarquia política 
característica da ordem inter-estatal contemporânea, bem como os enormes
 diferenciais de recursos e de poder entre os Estados, no quadro de um 
sistema internacional ainda fortemente hierarquizado, parecem garantir 
um “fim da História” bem movimentado para os atores que continuarem a 
participar desse cenário ‘pós-socialista’. De fato, não é credível que 
disputas hegemônicas e conflitos de poder venham a termo apenas porque a
 superestrutura ideológica do sistema mundial foi transformada pelo 
súbito desaparecimento de um dos seus pólos, uma ‘invenção’ mal 
concebida de engenharia social, mais mal implementada ainda, que num 
certo momento fez ‘tilt’, deu dois suspiros e depois morreu, sem choro e
 sem vela (bem, ocorreram, sim, algumas lágrimas e condolências sentidas
 de algumas viúvas do comunismo e de órfãos do socialismo, aqui mesmo no
 Brasil).
Entendamo-nos bem: Aron certamente não se importaria em que os aléas de l’Histoire conduzissem a Humanidade a um fin-de-siècle bem pouco aroniano, isto é, livre de uma vez por todas da terrível ameaça do holocausto nuclear. Mas, para ele, a superação da Machtpolitik
 da era bipolar não significava em absoluto que as relações 
internacionais contemporâneas – e presumivelmente as do futuro próximo –
 passassem a ser desprovidas, mesmo num cenário multipolar, de todo e 
qualquer elemento de ‘política de poder’. A despeito da crescente 
afirmação do primado do direito internacional – ou seja, da ‘força da 
razão’ — a Machtpolitik continuaria a existir por largo tempo 
ainda, inclusive em seus aspectos mais elementares de exercício puro e 
simples da ‘razão da força’.
A diferença está, provavelmente, em que,
 no cenário otimista traçado por Fukuyama, o desafio ideológico 
representado pelo socialismo – the socialist alternative, em suas palavras – simplesmente deixou de existir. Mesmo imaginando-se (no l’au-delà)
 o ‘sorriso cético’ de Raymond Aron – que, todavia, nunca reduziu o 
confronto inter-imperial a um mero enfrentamento ideológico –, não 
podemos descartar, de plano, a versão revista e melhorada por Fukuyama 
da tese de Bell sobre o ‘fim das ideologias’. Para fins do argumento em 
espécie, isto é, para a conformação de nosso ‘retorno ao futuro’ do 
socialismo, a differentia specifica representada pelo 
afastamento do concorrente ideológico pode ser funcionalmente 
explicativa para justificar um futuro “estado universal homogêneo” ao 
estilo hegeliano.
Numa época em os modernos ideólogos 
identificaram, repetidas vezes, sinais de “fim das ideologias” (ou, 
agora, do próprio “fim da História”), perde-se facilmente a visão de 
como o elemento ideológico influenciou a construção do mundo 
contemporâneo. O Ocidente em geral, nos últimos setenta anos, e a Europa
 em particular, nos últimos quarenta anos, viveram sob o signo das 
relações Leste-Oeste. Sua face mais ameaçadora produziu o que, 
acertadamente, ficou identificado sob o conceito de “guerra fria”. 
Depois de pelo menos quatro décadas de livre circulação, essa 
verdadeira hantise estratégico-ideológica parece agora ter-se 
finalmente encaminhado para o museu das antiguidades, ao lado do machado
 de bronze e da roca de fiar (como diria Engels).
A Guerra Fria entre as duas 
superpotências, que marcou indelevelmente toda a história da segunda 
metade do século 20, não foi, provavelmente, apenas um produto de 
ideologias conflitantes. Mas, foram certamente as racionalizações 
políticas e militares construídas a partir das “intenções malévolas” do 
concorrente estratégico que lhe deram uma dimensão jamais vista nas 
antigas disputas hegemônicas (seja entre os impérios da antiguidade 
clássica, seja entre os Estados-nacionais da era moderna). Mais que 
tudo, foi a crença ideológica – quase religiosa, podemos dizer – em uma 
missão histórica especificamente socialista, qual seja, a de enterrar 
não apenas o inimigo burguês, mas o próprio modo de produção 
capitalista, que exacerbou tremendamente o ‘conflito ideológico global’ 
(como diriam os generais da geopolítica), levando-o, em algumas 
ocasiões, ao limiar da escalada nuclear.
O afastamento da “espoleta ideológica” – a iskra
 leninista – do socialismo, antecipada pela tese sobre o “fim da 
História”, significaria agora que o mundo estaria encaminhando-se, 
finalmente, para uma era de paz (ou pelo menos de não-guerra) ? 
Descartando-se a permanência dos chamados conflitos regionais e das 
guerras locais conduzidas por motivos étnicos ou territoriais, é 
provável que sim, mas, isto tem pouco a ver com o fim do desafio 
socialista: o abafamento das paixões bélicas nas sociedades 
contemporâneas é mais o resultado de mudanças substantivas na ordem 
econômica global do que devido a motivos de natureza política ou 
ideológica (a falência do socialismo, finalmente, não significou apenas a
 bancarrota de uma idéia, mas o esboroamento de todo um ‘modo de 
produção’).
Com efeito, querer responsabilizar a 
ideologia socialista pelas “guerras de religião” contemporâneas (algo de
 que não se pode acusar Fukuyama) nada mais significa senão uma 
racionalização filosófico-sociológica a posteriori pouco 
condizente com uma realidade histórica muito mais complexa que todas as 
vãs “filosofias da história”, mesmo em versão supostamente hegeliana. 
Num século marcado pelas ideologias, o socialismo não foi, de longe, a 
mais belicista ou a mais agressiva delas, perdendo para o fascismo em 
várias frentes.
Um exame imparcial da história do período anterior a 1945, mostraria que não foi a oposição entre,’– conceda-se-lhes, cum grano salis,
 o epíteto de marxistas  – que provocou o quadro de instabilidade 
política e militar durante a primeira metade do século 20 e que 
precipitou os conflitos que retirariam definitivamente da Europa as 
alavancas do poder mundial. Ao contrário, foram os conflitos de natureza
 quase “feudal” – como diria o historiador Arno Mayer[6]
 –, latentes no continente europeu desde finais do século 19, que 
permitiram o surgimento do poder socialista e, com ele, do conflito 
ideológico global. Basta com mencionar a ação agressiva das novas 
potências da mittelEuropa para escapar ao cerco das 
velhas potências imperiais, ou o papel das ideologias fascistas do 
“espaço vital” e da “regeneração nacional” no entre-guerras, para dar a 
exata dimensão da responsabilidade do socialismo no caótico quadro 
político-militar da modernidade. A ‘ameaça socialista’ sempre foi menor 
do que se imaginou e poderia mesmo ter sido simplesmente irrelevante, 
para todos os efeitos práticos, não fosse por um desses imponderáveis do
 acaso  – os famosos ifs da história virtual – que costumam esconder-se nas já mencionadas dobras da História.
Não se deve, com efeito, esquecer que o 
surgimento da dimensão Leste-Oeste no contexto político europeu é 
virtualmente o resultado prático de um pequeno, mas fecundo, ‘acidente’ 
histórico, desencadeado involuntariamente por um dos beligerantes 
durante a Primeira Guerra Mundial: o retorno à Rússia de um punhado de 
bolcheviques exilados, praticamente desanimados pela ausência de 
perspectivas revolucionárias em sua terra natal. O voluntarismo 
oportunista da diplomacia do Kaiser, que buscava apenas provocar um 
pequeno “tremor” político na frente de guerra oriental, podendo servir a
 interesses militares imediatos, transformou-se porém em cataclismo 
histórico de proporções inimagináveis, dando nascimento aliás ao próprio
 conceito de relações Leste-Oeste.
Uma vez instalado o novo poder 
bolchevique, as diversas intervenções das potências ocidentais em 
território russo (ou soviético) contribuíram mais para alimentar a 
oposição ideológica irredutível com os países capitalistas do que uma 
suposta “luta de classes” em escala internacional. No segundo 
pós-guerra, igualmente, a busca constante do rompimento do ‘cerco 
imperialista’ era mais ditada por considerações de natureza estratégica 
(segurança militar) do que por reflexos de princípios ideológicos. Para 
Stalin, por exemplo, a razão de Estado sempre teve preeminência sobre o 
‘internacionalismo proletário’, este último invariavelmente servindo de 
disfarce ideológico aos interesses do Estado soviético. Exatamente por 
causa da a razão de Estado, que prevalece sobre as ideologias, não 
existe um “fim da história”, como o próprio Fukuyama reconhece ao final 
de seu ensaio.
4. Do fim da História ao fim da Geografia
Seja qual for o destino futuro da 
‘ideologia socialista’, seu itinerário terá pouco a ver com o ocaso da 
História. Na verdade, estamos assistindo, não tanto ao fim da História, 
quanto, mais propriamente, aos limites da Geografia, a partir da 
crescente globalização dos circuitos produtivos e da interdependência 
acentuada das economias desenvolvidas. O próprio Fukuyama observou que o
 desafio da alternativa socialista nunca esteve, realmente, no terreno 
das possibilidades concretas no Atlântico norte, região de capitalismos 
bem estabelecidos e de democracias de mercado relativamente estáveis – 
com a exceção, talvez, da periferia mediterrânea – e que o sucesso dessa
 alternativa foi, na verdade, sustentado por experiências em sua 
periferia: na Ásia, na África e numa simples ilha da América Latina.
De fato, foi na Ásia onde o socialismo 
conseguiu alguma penetração duradoura – hoje largamente simbólica – mas é
 nas universidades públicas da América Latina – em grande medida 
medíocres em termos de produção humanística significativa – onde o 
marxismo esclerosado ainda consegue uma ridícula sobrevivência, embora 
desprovido de qualquer inovação filosófica ou de melhorias 
significativas nas suas propostas econômicas relevantes.[7]
 Não se imagine, contudo, que o disfarce ‘socialista’ da liderança 
plutocrática chinesa constitua um sobrevivência qualquer da ideologia 
marxista, ou que ela represente um desafio fundamental ao capitalismo 
real: os líderes chineses, desde Deng Xiao-Ping, perceberam que a 
sobrevivência do ‘comunismo’ na China só se daria por obra e graça do 
capitalismo, e à sua construção eles vem se dedicando com extraordinário
 esforço e o zelo engajado dos verdadeiros crentes, os ‘novos cristãos’ 
da verdadeira fé nas virtudes do regime de mercados.
O que está em causa, obviamente, não é o
 futuro, sequer o destino do socialismo, mas pura e simplesmente o poder
 político nas mãos dos novos mandarins chineses, uma nova classe 
basicamente similar à antiga nomenklatura soviética, mas que 
foi esperta o bastante para construir um sistema de dominação que 
transforma os novos capitalistas em seus aliados permanentes, posto que,
 como ensina Fernand Braudel, o capitalismo só triunfa, de verdade, 
quando ele transforma em Estado, quando ele é o Estado.[8] Alguns observadores já chamaram esse novo sistema de “corporativismo leninista”,[9]
 mas o nome, na verdade, importa menos do que a realidade tangível do 
novo sistema chinês: esse sistema é essencialmente capitalista, mesmo se
 ele não é democrático e muito menos liberal, no sentido político da 
palavra; mas as políticas econômicas mobilizadas são, no seu sentido 
básico, de corte liberal. Aliás, em vista da crise econômica mundial de 
2008-2009, vários outros observadores se perguntaram se, depois do 
‘comunismo’ chinês ter sido salvo pelo capitalismo, não seria ele agora,
 pela pujança da demanda e da produção manufatureira de alcance global, a
 salvar o capitalismo. Ao que se sabe, o ensaio de Fukuyama não recebeu 
uma edição revista e atualizada para poder capturar esta última ‘astúcia
 da Razão’, ou essa “artimanha da História”, uma ironia suprema que 
seria bem recebida por Marx, mas certamente não por Lênin e seguidores.
5. Existem opções aos órfãos do socialismo?
Não é seguro que uma alternativa 
credível em termos de sistema econômico e político se apresente nos 
palcos da História, ainda que as viúvas do comunismo e os deserdados da 
causa mantenham uma esperança quase religiosa – que se renova 
febrilmente a cada crise do capitalismo – de que isso seja possível em 
suas vidas terrenas. O mais provável é que as últimas ‘terras 
incógnitas’ do capitalismo realmente existente – que são alguns 
tresloucados ‘socialistas do século 21’, perdidos em seus próprios 
desastres econômicos, e um punhado mais numeroso de satrapias africanas,
 mas que não constituem Estados, no sentido hegeliano do termo – se 
juntem à locomotiva da interdependência econômica mundial em algum 
momento deste século: embora atrasados, eles também serão bem-vindos, 
mesmo que tenham de desempenhar funções subalternas no trem do 
capitalismo, até sua própria qualificação produtiva.
Alternativas políticas à democracia 
liberal sempre podem existir, posto que as molas do poder respondem em 
grande medida mais às paixões humanas – o que os dramaturgos gregos, 
Shakespeare e Maquiavel já sabiam desde sempre – do que aos mecanismos 
de produção e de distribuição de ativos reais, e isto vem sendo provado a
 cada instante da história mundial. Não se imagina, porém, que o ‘som e a
 fúria’ da luta pelo poder, nas comunidades contemporâneas conduza a 
novos tipos de conflitos globais como os conhecidos desde a era 
napoleônica até a ‘segunda guerra de trinta anos’ do século 20. Nenhuma Realpolitik se exerce da mesma maneira depois que o gênio do poder nuclear saiu da garrafa.
Aliás, a Realpolitik da atualidade tem um novo nome, superioridade tecnológica, e o cenário de seu desenvolvimento é a própria weltwirtschaft, a economia mundial, num mundo cada vez mais borderless,
 ou seja, sem fronteiras. Com efeito, assiste-se hoje em dia a um 
deslocamento de hegemonias, menos devido à força das canhoneiras do que 
ao peso dos navios cargueiros (a China, por falar nisso, possui os 
maiores portos do mundo). Mais exatamente, a tendência não é mais à 
constituição de rivais imperiais, mas ao estabelecimento de competidores
 mais eficazes, guerreiros de uma nova espécie, que buscam não tomar de 
assalto velhas fortalezas, mas inundá-las com pacíficos obuses 
eletrônicos, manufaturados segundo os mais modernos requisitos da 
tecnologia.
Os cavaleiros mais dinâmicos dessa nova 
ordem mundial consideram os arsenais nucleares como catapultas pouco 
práticas do ponto de vista das modernas técnicas de conquista, da mesma 
forma que eles tendem a desdenhar os conflitos ideológicos como querelas
 teológicas de reduzido poder agregador: os hábitos de consumo unificam 
mais os povos, hoje em dia, do que as velhas crenças. Teutônicos ou 
samurais, mandarins ou gurus da nova era, os novos cavaleiros da 
economia mundial não buscam exatamente dominar ou converter outros 
povos, mas tão simplesmente extrair recursos pela via comercial.
A estratégia econômica desses novos 
cruzados é verdadeiramente internacional, no sentido mais planetário do 
termo: busca de vantagens comparativas dinâmicas, rápido deslocamento 
geográfico de fatores, divisão racional de mercados, em suma, uma 
globalização acabada dos circuitos produtivos e de distribuição. A 
característica mais saliente dessa nova ordem mundial é a crescente 
interdependência dos países mais inseridos na economia de mercado. Mas, 
assim como na fábula orwelliana sobre a ‘igualdade’ na fazenda 
‘socialista’ dos animais, nessa nova ‘fazenda capitalista’ das nações, 
alguns membros são mais ‘interdependentes’ do que outros. Não se trata 
apenas de saber quem é mais ‘transnacional’ nessa confraria, mas sim de 
determinar quem melhor sabe maximizar os mecanismos de controle da 
racionalidade instrumental própria à economia de mercado: o lucro e o 
investimento produtivo.
Assim, se o “fim da História” – 
compreendido não no sentido de que o mundo estaria a ponto de se tornar 
um porto tranquilo para o exercício da democracia política, mas no do 
término da busca dos princípios fundamentais que devam reger a 
organização da sociedade – está ou não próximo de converter-se em 
realidade, esta é uma questão ainda em aberto. Uma alternativa política 
ao liberalismo ocidental não parece, em todo caso, perto de nascer. Isto
 não quer dizer que não existam alternativas práticas, reais, à 
democracia burguesa, como o próprio caso da China o demonstra. O que se 
pretende constatar é que o sistema chinês de dominação política não 
oferece atrativos para qualquer país que se pretenda ‘normal’ no quadro 
da interdependência contemporânea: ele simplesmente não constitui um 
modelo que possa ser replicado em caráter voluntário por outras 
comunidades políticas. Não fosse assim, a plutocracia chinesa não 
precisaria manter um formidável aparato de repressão, disseminar a 
censura pelos terrenos sempre fugidios da internet, condenar a condenar 
“dissidentes” e “violadores da legalidade” com o mesmo ardor – embora 
com menor brutalidade – que seus antecessores declaradamente 
marxistas-leninistas. A tese de Fukuyama, em seus contornos filosóficos,
 ainda não foi desmentida pelos defensores do ancien régime leninista.
Em outros termos, a boa e velha 
democracia burguesa, em que pese algumas rugas vitorianas, ainda não 
parece ter sido vencida por alguma “contradição insanável”, do tipo das 
que costumavam frequentar o universo conceitual do marxismo clássico. Em
 contrapartida, no terreno da economia, o ‘fim da Geografia’ parece mais
 à vista, sobretudo quando se considera o escopo espacial das atividades
 empresariais. O mundo material está sendo progressivamente unificado 
por uma ‘cultura comum’, senão da abundância, pelo menos de consumismo, 
posto que jovens iranianos de uma das teocracias mais reacionárias que 
possam existir, jovens chineses do “socialismo de mercado” e jovens 
bolivarianos de um novo socialismo surrealista, todos eles desejam 
encontrar satisfação para padrões de consumo relativamente similares: 
filmes série B de Hollywood, fast-food, iPhone, iPod e internet. Quem 
fica de fora – cubanos, coreanos do norte – está louco para entrar…
Esse processo de constituição de um borderless-world
 não deve ser confundido com o pretenso ‘declínio do Estado-nação’, 
tendência já desmentida pelo acelerado ressurgimento do ‘nacionalismo’ 
nos mais diversos quadrantes do globo. O que ocorre, mais exatamente, é 
uma combinação do policentrismo inter-estatal com a unificação dos 
espaços geoeconômicos, nos quais as competências estritas dos Estados 
nacionais no terreno econômico passam a ser exercidas por blocos de 
integração (zonas de livre comércio, uniões aduaneiras ou mercados 
comuns). Em todo caso, não parece haver muito espaço para o socialismo 
nesse “admirável mundo novo” do ‘fim da Geografia’. Ele só consegue 
sobreviver nas academias esclerosadas de certas faculdades de ciências 
sociais de universidades públicas de países periféricos, como mais uma 
demonstração de certas profecias corrosivas (como aquela de Millor 
Fernandes, que dizia que quando as ideologias ficam bem velhinhas, elas 
se mudam para certos países latino-americanos que conhecemos todos).
Na prática, como as economias de mercado
 conseguem conviver com todos os tipos de regimes políticos, o que se 
tem é que o mercado e a democracia política convivem tranquilamente com 
esquemas diversos de controle social e de intervencionismo estatal, um 
pouco, aliás, como em diversos países periféricos do ‘capitalismo 
realmente existente’. Isso não representa exatamente um problema 
filosófico do ponto de vista das teses de Fukuyama: se a chamada 
‘democracia burguesa’ conseguiu sobreviver durante tanto tempo, foi 
exatamente devido a seu caráter essencialmente ‘formal;, ou seja, uma 
democracia simplesmente política, destituída de qualquer conteúdo real, 
em termos de direitos econômicos ou sociais. Contudo, a simples garantia
 da igualdade jurídica e da liberdade individual representa, ainda 
assim, um enorme passo à frente no itinerário da sociedade civil, pelo 
menos para grande parte da Humanidade. É possível, assim, que a 
administração da ‘coisa pública’ nesses regimes híbridos que existem no 
mundo real seja uma tarefa tão ‘aborrecida’ e fastidiosa quanto, 
digamos, a atividade política em certas democracias avançadas do 
Ocidente, algo que já tinha sido percebido por um filósofo tão pouco 
hegeliano quanto Norberto Bobbio.
O fato, porém, de que nenhum sistema 
social humanamente concebido poderá resolver a contento a questão da 
distribuição dos bens raros e socialmente valorizados – e a mercadoria 
‘poder’ é a primeira a inscrever-se nessa categoria – garante que os 
palcos da História continuarão, durante muito tempo, a ser excitantes. 
Não há, aqui, nenhum pessimismo de princípio quanto a que, no terreno do
 mundo material pelo menos, se possa um dia realizar a conhecida utopia 
socialista: “de cada um segundo suas capacidades, a cada um segundo suas
 necessidades”. Mas, é altamente improvável, conhecendo-se a natureza 
humana, que se possa cumprir, com ou sem ‘final da História’, a profecia
 engelsiana segundo a qual, no futuro, “o comando dos homens será 
substituído pela administração das coisas”.
[1] Ver Francis Fukuyama, “The End of History?”, The National Interest (Summer 1989, p. 3-18), bem como seu livro sobre a questão: The End of History and the Last Man (New York: Free Press, 1992).
[2]
 Hegel não foi o primeiro, em termos absolutos; antes dele, filósofos 
escoceses (como Ferguson) e franceses (como Condorcet) já tinham 
debatido a idéia do progresso da civilização, muitas vezes numa 
perspectiva linear, seguindo a flecha do tempo; mas foi Hegel quem deu à
 idéia de progresso um sentido de necessidade histórica, que o fez 
situar-se no centro da evolução possível das sociedades humanas.
[3]
 Marx inverteu esse processo, como se sabe, mas apenas para converter o 
socialismo na realização necessária, em última instância, da idéia 
universal, uma espécie de fatalismo pelo lado da sucessão inevitável dos
 ‘modos de produção’, um conceito que ele cunhou e que ainda hoje é 
usado por discípulos, de modo geral, mas também por opositores dos 
próprios sistemas hegeliano e marxista.
[4] Sobre essa verdadeira “contradição nos termos” – como disse Marx a propósito do sistema de Proudhon, exposto em Filosofia da Miséria, e criticado por ele em Miséria da Filosofia (1847) –, ver meu artigo: “Falácias acadêmicas, 13: o mito do socialismo de mercado na China”, Espaço Acadêmico (ano 9, n. 101, outubro 2009, p. 41-50; disponível: http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/8295/4691).
[5]
 Ver, a esse propósito, meu ensaio “Uma paz não-kantiana?: Sobre a paz e
 a guerra na era contemporânea”, In: Eduardo Svartman, Maria Celina 
d’Araujo e Samuel Alves Soares (orgs.), Defesa, Segurança Nacional e Forças Armadas: II Encontro da Abed (Campinas: Mercado de Letras, 2009, p. 19-38; disponível: http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/1987PazNaoKantianaABEDbook.pdf).
[6] A caracterização é do historiador Arno Mayer, The Persistence of the Old Regime: Europe to the Great War (London: Croom Helm, 1981); existe edição brasileira.
[7]
 Veja-se, a esse propósito, a nota crítica que fiz, a propósito de um 
desses exemplos lamentáveis de marxismo esclerosado da academia 
brasileira, nesta texto: “Marxistas totalmente contornáveis” [Resenha de
 Jorge Nóvoa (org.): Incontornável Marx (Salvador/São Paulo: Unesp/UFBA, 2007)], Espaço Acadêmico (ano 7, n. 84, maio 2008, disponível: http://www.espacoacademico.com.br/084/84res_pra.htm);
 ela suscitou, como seria de se esperar, reações enraivecidas por parte 
da tribo em questão, devidamente registradas neste artigo: “Manifesto 
Comunista, ou quase…:  dedicado a “marquissistas” à beira de um ataque 
de nervos (a propósito de uma simples resenha)”, Espaço Acadêmico (ano 8, n. 85, junho de 2008; disponível: http://www.espacoacademico.com.br/085/85pra.htm).
[8] Ver a trilogia braudeliana, Civilisation Matérielle, Economie et Capitalisme, XV-XVIIIème siècles (Paris: Armand Colin, 1979, 3 vols.).
[9] Cf. Jean-Luc Domenach, La Chine m’inquiète (Paris: Perrin, 2008), p. 58 e 65-66.
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