sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

História e Verdade


Embora muitos acreditem que a história seja a ciência dos fatos relativos à vida de um povo, é fenômeno relativamente comum que, de um mesmo evento, dois historiadores extraiam teses diametralmente opostos. Livros didáticos de história, como mostrou reportagem publicada pela Folha na semana passada, não escapam a essa tendência.
Atualmente, um livro brasileiro pode ser criticado seja por tratar Francisco Solano López como líder paraguaio que desejava construir um país forte e soberano seja por tratar todos os grupos étnicos de negros que aqui chegaram apenas com "africanos".
São críticas que, diga-se, fazem algum sentido. Quando se comenta a história da Guerra do Paraguai, é sem sombra de dúvida importante indicar que Solano López se opunha ao imperialismo inglês, mas não dá para deixar de mencionar que o homem era um caudilho.
Analogamente, é simplificação preconceituosa tratar como iguais todos os tipos de negros que vieram ao Brasil sem nem tentar mencionar que havia principalmente bantos e sudaneses, que, por sua vez, se subdividem em várias dezenas de etnias. É realmente desconcertante que o Brasil, a segunda maior nação negra do planeta, menor apenas do que a Nigéria, insista em ignorar tão olimpicamente a história africana.
Reparos à parte, convém registra que houve uma evolução importante. Não muitos anos atrás, os livros escolares ainda enalteciam o duque de Caxias como grande herói nacional. Embora o patrono do Exército brasileiro tenha cumprido a missão que lhe foi dada e possa ainda hoje ser considerado um herói, atualmente questiona-se o papel do Brasil num conflito com contornos genocidas como foi a Guerra do Paraguai.
Toda "verdade" histórica é antes de mais nada um versão para um conjunto de fatos. Essa é uma concepção de história bastante disseminada hoje, no que representou significativo avanço em relação aos tempos em que se acreditava numa história neutra, objetiva e baseada unicamente em fatos indisputáveis.
O risco da interpretação mais moderna é desembocar no desprezo pelo fato. Se tudo é uma questão de juízos, de ideologia, então por que o autor não fica apenas com sua tese e adapta os fatos a ela? De certo modo, isso ocorre. E não se pode afirmar que os historiadores que seguiram exclusivamente essa linha tenham trazido uma grande contribuição para a ciência histórica. O que trouxeram foi falsificação, às vezes consciente, às vezes não. Às vezes evidente, às vezes não.
Existe, obviamente, uma grande e interminável discussão teórica, que deveria, em algum grau, estar presente nos próprios livros didáticos. O fato ( se ainda é lícito falar em fato ) é que, pela diversidade de interpretação hoje à disposição de alunos e de professores, ficou mais fácil começar a entender história. Existe aqui um pouco do que Hegel chamou de dialética.

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